30-10-2020
Uma empresa portuguesa é detentora de 90 por cento do capital social numa empresa em Angola e em outra em Cabo Verde. Na eventualidade da empresa adquirida registar lucros, esses valores devem ser registados na contabilidade da empresa adquirente? Se sim, como? E na eventualidade de registar prejuízos?
Parecer técnico
Na situação em análise as questões colocadas referem-se ao reconhecimento dos resultados (lucros ou prejuízos) por parte de uma entidade pela participação noutras empresas (participação de 90 por cento numa empresa localizada em Angola e outra localizada em Cabo Verde).
Atendendo que na situação em apreço não é informado o normativo contabilísticos adota pela entidade, pressupomos que adota as normas contabilísticas e de relato financeiro (NCRF).
O tratamento contabilístico relacionado com as participações de partes de capital de outra entidade está previsto nas normas contabilísticas e de relato financeiro (NCRF) n.º 13 - «Interesses em empreendimentos conjuntos e investimentos em associadas»; NCRF 15 - «Investimentos em subsidiárias e consolidação» e NCRF 27 - «Instrumentos financeiros».
É importante classificar o investimento financeiro, pois este pode ser considerado como investimento em subsidiária, em associada ou um mero ativo financeiro disponível para venda.
Se a participação social adquirida implicar que a entidade detentora da participação social passe a deter o controlo da entidade participada, isto é, se a entidade detentora tiver o poder de gerir as políticas financeiras e operacionais da entidade participada para obter benefícios da mesma, então tal participação deve ser considerada como um investimento numa subsidiária, aplicando-se os critérios de mensuração da NCRF 15 (MEP). Normalmente, o controlo é determinado pela detenção pela entidade investidora da maioria (mais de 50 por cento) dos direitos de voto nas tomadas de decisão na entidade participada.
Se a participação social implicar que a entidade detentora da participação social apenas detém uma influência significativa (entre 20 a 50 por cento) da entidade participada, ou seja, se a entidade detentora apenas tem o poder de participar (e não de gerir) nas decisões das políticas financeira e operacional da investida, então tal participação deve ser considerada como um investimento numa associada, aplicando-se os critérios de mensuração da NCRF 13.
Uma empresa que apenas detém um investimento numa associada não é obrigada a preparar e apresentar demonstrações financeiras consolidadas. No entanto, se essa participação for relatada nas demonstrações financeiras consolidadas dessa empresa detentora, é mensurada também pelo método da equivalência patrimonial.
Finalmente, se a participação social da entidade detentora não permitir a existência de controlo ou de influência significativa nas políticas financeiras e operacionais da entidade participada, esse investimento deverá ser mensurado pelo custo ou pelo justo valor, se este for determinado fiavelmente, nos termos da NCRF 27.
Normalmente, não existe controlo ou influência significativa quando a participação social representar direitos de voto inferiores a 20 por cento nas tomadas de decisão na entidade participada.
De referir que para se determinar a existência de controlo ou influência significativa interessa determinar a percentagem de controlo (sobre os direitos de voto) na participada, e não a percentagem de participação. A percentagem de participação apenas é importante para a aplicação do método de equivalência patrimonial.
Um investimento numa subsidiária é contabilizado usando o método da equivalência patrimonial (MEP), exceto se existirem restrições severas e duradouras que prejudiquem substancialmente o exercício pela investidora dos seus direitos sobre o património ou a gestão dessa entidade ou a participação não seja materialmente relevante.
A percentagem de participação é importante para a aplicação do MEP, ou seja, para a mensuração do investimento na participada pelo MEP. No caso concreto estamos perante uma percentagem de detenção de 90 por cento, pelo que, estamos perante a participação em subsidiárias. Assim sendo, as participações devem ser reconhecidas pelo MEP.
De acordo com o parágrafo 63 da NCRF 13, pelo método da equivalência patrimonial, o investimento numa entidade é inicialmente reconhecido pelo custo e a quantia escriturada é aumentada ou diminuída para reconhecer a parte do investidor nos resultados da investida depois da data da aquisição.
A parte do investidor nos resultados da investida é reconhecida nos resultados do investidor.
No caso concreto, a questão colocada está relacionada com os registos contabilísticos referentes à imputação dos resultados imputável à participação.
Podem ser considerados os seguintes movimentos:
Na data de aquisição da participação:
Pelo custo de aquisição da participação financeira na participada:
41x11 - Participações de capital – método da equivalência patrimonial, pelo justo valor do interesse nos ativos, passivos e passivos contingentes da adquirida;
41x12 - Participações de capital – método da equivalência patrimonial - goodwill, pela diferença positiva entre o custo da aquisição e o interesse nos justos valores do património adquirido (se for o caso).
a
12 - Depósitos à ordem, pelo custo de aquisição da participação (ou se for o caso) 7858 - Rendimentos e ganhos em subsidiárias, associadas e empreendimentos conjuntos - Outros ganhos, pela diferença negativa entre o custo da aquisição e o interesse nos justos valores do património adquirido.
Em cada data de relato (data do balanço):
Pelo reconhecimento do ganho financeiro referente aos lucros da participada, se existirem (aplicação do MEP):
41x1 - Participações de capital - MEP
a
7851 - Rendimentos e ganhos em subsidiárias, associadas e empreendimentos conjuntos - Aplicação do MEP, pela proporção do lucro obtido pela participada.
Em cada data de relato (data do balanço):
Pelo reconhecimento da perda financeira referente aos prejuízos da participada, se existirem (aplicação do MEP):
6852 - Gastos e perdas em subsidiárias, associadas e empreendimentos conjuntos - Aplicação do método da equivalência patrimonial
a
41x1 - Participações de capital - MEP, pela proporção do prejuízo obtido pela participada.
Pela distribuição de resultados, a empresa-mãe deve reduzir o investimento na participada pelo montante da respetiva participação.
Se, no exercício seguinte, se verificar que os lucros imputados excederam os lucros atribuídos, a empresa participante deve registar a diferença na conta 5712 - Ajustamentos em ativos financeiros - Relacionados com o método da equivalência patrimonial - Lucros não atribuídos.
Pelo reconhecimento do lucro atribuído na Assembleia-geral:
278x - Participada x - Lucros atribuídos
a
41x1 - Participações de capital em subsidiárias - MEP, pelo montante dos dividendos distribuídos X percentagem de participação.
Pelo eventual valor de lucros não distribuídos:
56 - Resultados transitados, pelo montante não distribuído
a
5712 - Lucros não atribuídos
No caso de a entidade adotar a norma contabilística e de relato financeiro para pequenas entidades (NCRF-PE), de acordo com o parágrafo 17.7 da NCRF-PE resulta que, a aplicação dos procedimentos referidos referente à classificação dos investimentos financeiros como investimentos em subsidiárias, associadas ou entidades conjuntamente controladas e a respetiva aplicação da mensuração subsequente pelo MEP não é obrigatória, sendo meramente opcional.
Caso a entidade adotar a normas das microentidades (NC-ME), nos termos do parágrafo 17.3, uma entidade deve mensurar os seus ativos e passivos financeiros ao custo, entendido como a quantia nominal dos direitos e obrigações contratuais envolvidos.
Os ativos financeiros relativos a participações de capital são mensurados ao custo de aquisição, sujeito a ajustamentos subsequentes derivadas de eventuais imparidades.
A NC-ME nunca permite a mensuração de qualquer ativo financeiro ao justo valor, independentemente de existirem cotações oficiais em mercado regulamentado para esses instrumentos financeiros, nem pelo método de equivalência patrimonial. Adicionalmente, não se verifica a possibilidade de reconhecimento de qualquer goodwill decorrente da aquisição da participação, uma vez que, como referido, o método aplicável neste referencial contabilístico é o método do custo.
Em termos de contabilização, não se aplicando o método da equivalência patrimonial, pelo apuramento do lucro ou prejuízo nas participadas não há lugar a qualquer registo contabilístico na esfera da empresa-mãe. Apenas haverá lugar a registo contabilístico no momento da distribuição dos resultados. Nesse momento o registo contabilístico deve ser:
278x - Outros devedores e credores - dividendos atribuídos
a
792x - Dividendos obtidos.