PT27103 – julho de 2022
Determinada empresa compra mercadoria no Reino Unido e, como tal, tem despesas de transporte e desalfandegamento. Como deve ser a contabilização? Deve ir para compra de mercadorias ou para despesas de transporte, isto porque a fatura do transporte vem separada da fatura da mercadoria?
Outra dúvida é ao tirar a fatura da venda de mercadoria quando se fatura ao cliente as despesas de transporte. Neste caso pode discriminar-se na fatura despesas de transporte? Como deve ser a contabilização do pedido do reembolso das despesas de transporte ao cliente? Deve ser na conta da venda de mercadorias ou numa conta de proveitos?
Parecer técnico
O pedido de parecer está relacionado com o enquadramento contabilístico das seguintes operações:
• Registo contabilístico das despesas de desalfandegamento e de transporte, na aquisição de mercadorias do Reino Unido;
• Registo contabilístico do débito de despesas, relativos ao transporte, incluído na fatura de vendas aos clientes.
Registo contabilísticos das despesas de desalfandegamento e transporte na aquisição de inventários - Os inventários têm o tratamento contabilístico na norma contabilística e de relato financeiro (NCRF) n.º 18 - Inventários, no parágrafo 11 da norma contabilística de relato financeira para pequenas entidades (NCRF-PE) e no parágrafo 11 da norma contabilística para microentidades (NC-ME).
São considerados como inventários, todos os ativos adquiridos ou produzidos destinados a venda ou a inclusão na produção (ou na execução de prestação de serviços), no âmbito da atividade ordinária da entidade.
De acordo com a norma, os inventários são mensurados pelo custo (de aquisição ou de produção) ou pelo valor realizável líquido, dos dois o mais baixo.
O custo dos inventários, deve incluir os custos de compra, custos de conversão e outros custos incorridos para colocar os inventários no seu local e condições atuais.
Sobre os custos de compra, as normas referem que, estes incluem o preço de compra, direitos de importação e outros impostos (que não sejam os subsequentemente recuperáveis das entidades fiscais pela entidade) e custos de transporte, manuseamento e outros custos diretamente atribuíveis à aquisição de bens acabados, de materiais e de serviços. Devem deduzir-se ao custo de compra descontos de natureza comercial e abatimentos.
Face ao exposto, no caso apresentado, as despesas de desalfandegamento e de transporte, devem ser contabilizadas na conta 31 - Compras e acrescer ao valor dos inventários.
Relativamente à segunda questão (débito de despesas de transporte), é questionada a contabilização das despesas de transporte debitadas ao cliente.
De modo a respondermos à questão concreta, socorrer-nos-emos da alínea b) do número 5 do artigo 16.º do CIVA, que refere:
«5 - O valor tributável das transmissões de bens e das prestações de serviços sujeitas a imposto, inclui: (...)
b) As despesas acessórias debitadas, como sejam as respeitantes a comissões, embalagem, transporte, seguros e publicidade efetuadas por conta do cliente.»
Neste sentido, em termos de enquadramento em sede de IVA, o débito ao cliente de despesas acessórias à transmissão dos bens, nomeadamente de despesas de transporte, deverá ser tratado como uma componente do valor tributável dessa transmissão de bens, nos termos da alínea b) do n.º 5 do artigo 36.º do CIVA.
Face ao exposto, realçamos que ao montante dos portes debitados aos clientes será aplicável, para efeitos de IVA, o mesmo enquadramento aplicável aos bens transmitidos. Quer isto dizer que:
- Se os bens forem enviados a clientes portugueses (sujeito passivos ou particulares) na emissão da fatura relativa à venda de bens deve incluir a mesma taxa de IVA ao valor a cobrar dos portes de envio.
- Se os bens forem enviados para países terceiros e se encontrarem reunidas as condições para que seja aplicável a isenção prevista na alínea a) do número 1 do artigo 14.º do CIVA, então, os portes encontrar-se-ão igualmente isentos de IVA ao abrigo dessa disposição. Salientamos que a isenção prevista na alínea p) do número 1 do artigo 14.º do CIVA será aplicável, por exemplo, pelos próprios transportadores;
- Se os bens forem enviados para um particular domiciliado na União Europeia, estando em causa, desse modo, vendas à distância intracomunitárias:
- Caso o sujeito passivo opte por se inscrever no Balcão Único (OSS), nomeadamente no regime da União, o que fará, como sabemos, nos termos da regra de localização prevista no artigo 10.º do RITI, com que estas operações se localizem e, consequentemente, sejam tributadas no Estado-membro de destino dos bens, então, face às regras anteriormente expostas, ao valor dos portes deverá ser aplicada a taxa de IVA em vigor no país de destino dos bens,
- Caso o sujeito passivo não opte por se inscrever no OSS e partindo do pressuposto de que se encontram reunidas as condições para que seja aplicado o regime de derrogação previsto no número 1 do artigo 6.º-A do CIVA, então, sem prejuízo do disposto no artigo 10.º do RITI, tais operações considerar-se-ão como localizadas e, desse modo, tributadas em território nacional, pelo que será aplicável a respetiva taxa nos termos da legislação portuguesa.
Face ao exposto, a entidade poderá inserir na fatura de venda uma linha destinada ao débito de portes ou então, emitir uma fatura em separado.
Caso se esteja perante o redébito de gastos, convém dar nota do seguinte:
Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 1.º do Código do IVA (CIVA), estão sujeitas a IVA as prestações de serviços, quando realizadas no território nacional, a título oneroso, por um sujeito passivo agindo como tal.
Sendo que se consideram prestações de serviços, conforme refere o n.º 1 do artigo 4.º do CIVA «(...) as operações efetuadas a título oneroso que não constituem transmissões, aquisições intracomunitárias ou importações de bens (...).»
Ora, o débito de despesas, em sede de IVA é uma operação que se insere no conceito de prestação de serviços, e, como tal, é uma operação sujeita a imposto.
Em termos contabilísticos, apresentamos de seguida os dois cenários possíveis relativamente à refaturação de despesas ao cliente:
Num primeiro cenário, poderemos estar perante quantias pagas em nome e por conta do adquirente dos bens ou do destinatário dos serviços, registadas pelo contribuinte em contas de terceiros apropriadas.
Isto implica que, depois das despesas serem pagas, a entidade faculta ao cliente os documentos de suporte, originais, relativos a essas despesas, que devem estar emitidos em nome do cliente.
Neste caso os registos contabilísticos seriam:
- Lançamento: Pagamento por conta do cliente:
Débito 2781 - Outros devedores e credores
Crédito 11 - Caixa/12 - Depósitos à ordem
Segundo lançamento - recebimento do cliente:
Débito 11 - Caixa /12 - Depósitos à ordem
Crédito 2781 - Outros devedores e credores
No segundo cenário, e não estando perante despesas em nome e por conta do cliente, os registos contabilísticos seriam:
Primeiro lançamento -pagamento da(s) despesa(s):
Débito 62.X - Fornecimentos e serviços externos
Crédito 11 - Caixa/12 - Depósitos à ordem
Segundo lançamento: imputar a(s) despesa(s) ao cliente
Débito 2111.X - Clientes c/c
Crédito 62.X - Fornecimentos e serviços externos (ou conta 788 - Outros rendimentos - Outros)
Terceiro lançamento - recebimento relativo a(s) despesa(s)
Débito 11 - Caixa /12 - Depósitos à ordem
Crédito 2111.X - Clientes c/c
Por outro lado, no caso dos dispêndios suportados pela entidade, com faturas emitidas em nome da mesma, então estes devem ser reconhecidos como gastos. De referir que, nos termos do parágrafo 34 da norma contabilística e de relato financeiro (NCRF) n.º 1 - Estrutura e conteúdo das demonstrações financeiras, os itens a apresentar da demonstração dos resultados deve atender à sua natureza.
Assim, os gastos suportados são originalmente contabilizados nas respetivas contas de gastos. Posteriormente, no momento do seu "redébito" é aceitável que se possa creditar a conta de gastos respetiva. Alternativamente poderá ser utilizada uma conta 788 - Outros rendimentos - Outros não especificados.