Subsídios: devolução de parte do incentivo PT2020
PT28278 - agosto, 2024
Determinada empresa recebeu recentemente uma notificação para devolver um incentivo recebido ao longo dos anos de 2021 e 2022. Esta devolução será no valor de aproximadamente 50 mil euros ao longo do período de 2024 a 2026. O incentivo foi inicialmente contabilizado numa conta 75. Qual será o lançamento a fazer em 2024 pela notificação de devolução?
Parecer técnico
Na situação em análise as questões colocadas referem-se ao tratamento contabilístico da devolução de parte do incentivo PT2020.
Considerando que não nos é informado as normas contabilísticas adotadas pelas entidades, a resposta será baseada nas normas contabilísticas e de relato financeiro (NCRF). Em todo o caso, para a questão em apreço o procedimento é idêntico em todos as normas contabilísticas.
A contabilização dos subsídios deve atender aos procedimentos previstos na norma contabilística e de relato financeiro (NCRF) n.º 22 - "Subsídios e outros apoios das entidades públicas.
O tratamento contabilístico dos subsídios não reembolsáveis, nomeadamente o reconhecimento e apresentação nas demonstrações financeiras, é diferente dependendo do fim a que se destina.
O princípio contabilístico a ter em atenção na contabilização dos subsídios é o princípio do balanceamento entre rendimentos e gastos, devendo o subsídio ser reconhecido nos rendimentos do período, no momento e na mesma proporção, em que for reconhecido o gasto subsidiado, conforme previsto no parágrafo 14 da NCRF 22.
Em termos de reconhecimento dos subsídios, em primeiro há que identificar o momento que esse subsídio deve ser inicialmente reconhecido nas demonstrações financeiras.
No balanço, o subsídio deve ser inicialmente reconhecido quando exista segurança de que a entidade cumprirá as condições a ele associadas e de que os mesmos serão recebíveis, independentemente de ainda não ter sido efetivamente recebido, conforme previsto nos parágrafos 8 e 9 da NCRF 22.
Normalmente, com a aprovação da atribuição do apoio financeiro pela entidade gestora da medida de apoio, estão cumpridos os critérios de reconhecimento do subsídio, pelo que o mesmo pode ser sido reconhecido no balanço nesse período. Mas, é possível que esse reconhecimento inicial possa apenas ser efetuado num período posterior.
Para determinar o momento do reconhecimento inicial do subsídio, a entidade deve efetuar um juízo de valor e julgamentos sobre a sua capacidade para cumprir as condições associadas ao subsídio atribuído, ainda que se trate de objetivos a alcançar em períodos futuros.
Com base nesses juízos de valor e julgamentos, deve efetuar estimativas para o cálculo do montante do subsídio a ser atribuído.
Os fatores a ter conta para a realização dessas estimativas e julgamentos devem ser aqueles diretamente relacionados com a execução do investimento e operação do projeto proposto na candidatura ao subsídio.
Tal como decorre do parágrafo 26 da NCRF 4 - Políticas contabilísticas, alterações nas estimativas contabilísticas e erros, o uso de estimativas é uma parte essencial da preparação de demonstrações financeiras e não diminui a sua fiabilidade, devendo ser objeto de revisões periódicas.
Na demonstração dos resultados, para o reconhecimento há que ter em atenção o referido princípio do balanceamento entre rendimentos e gastos.
Os subsídios atribuídos devem ser reconhecidos nos resultados (rendimentos) do período na mesma proporção dos respetivos custos subsidiados incorridos pela entidade e reconhecidos como gastos do período, tendo também em atenção o pressuposto do regime do acréscimo, ou seja, deve ser reconhecido independentemente do momento do recebimento.
Em termos de apresentação nas demonstrações financeiras, de acordo com os parágrafos 22 e 25 da NCRF 22, os subsídios não reembolsáveis relacionados com a aquisição ou produção de um ativo (fixo tangível ou intangível) (também conhecidos como subsídios ao investimento), devem ser apresentados como componente do capital próprio (conta 593 e rubrica «Outras variações no capital próprio»), e imputados como rendimentos do exercício (conta 7883) numa base sistemática e racional durante a vida útil do ativo, ou seja, pela proporção da depreciação ou amortização do ativo fixo tangível ou ativo intangível, respetivamente.
Os subsídios relacionados com rendimentos (conhecidos como subsídios à exploração), que são concedidos para assegurar uma rentabilidade mínima ou compensar deficits de exploração de um dado exercício imputam-se como rendimentos desse período (conta 75), ou de período futuros, se se destinarem também a assegurar rentabilidades mínimas ou a compensar deficits de exploração desses períodos futuros, mais uma vez tendo presente o princípio do balanceamento entre rendimentos e gastos e o pressuposto do regime do acréscimo.
No caso em concreto, estamos perante a devolução de um subsídio, pelo que se a entidade vier a constatar que não irá receber o valor total ou parcial do subsídio reconhecido inicialmente, há que atender aos procedimentos previstos na NCRF 22 para o reembolso de subsídios.
Nos termos dos parágrafos 29 a 31 da NCRF 22, um subsídio que se torne reembolsável deve ser contabilizado como uma revisão de uma estimativa contabilística, ou seja, com tratamento prospetivo, que origina afetação aos resultados do período ou de períodos futuros, e não a correções de resultados de períodos anteriores.
O reembolso de um subsídio relacionado com rendimentos deve ser aplicado em primeiro lugar em contrapartida das componentes onde se encontrem refletidas as importâncias ainda não imputadas como rendimento.
Na medida em que o reembolso exceda tais componentes, ou quando estas não existam, o reembolso deve ser reconhecido imediatamente como um gasto nos resultados do período.
Se se tratar de um subsídio relacionado com rendimentos, o registo contabilístico da reclassificação do subsídio de não reembolsável para reembolsável pode ser o seguinte:
Pelo desreconhecimento do subsídio:
Se ainda não tiver sido reconhecido como rendimento em períodos anteriores:
- Débito da conta 282 - Rendimentos a reconhecer, por contrapartida a crédito da conta 278x - Outros devedores e credores - Entidade gestora da medida de apoio, pela quantia escriturada transformada em subsídio reembolsável.
Se já tiver sido reconhecido como rendimento em períodos anteriores:
- Débito da conta 688x - Outros gastos e perdas - Outros por contrapartida a crédito da conta 278x - Outros devedores e credores - Entidade gestora da medida de apoio, pela quantia escriturada transformada em subsídio reembolsável.
Pela devolução do subsídio recebido em excesso
- Débito da 278x - Outros devedores e credores - Entidade gestora da medida de apoio, por contrapartida a crédito da 12 - Depósitos à ordem, pela quantia a devolver.
Por outro lado, caso tenha existido um erro contabilístico no reconhecimento da estimativa do cumprimento dos requisitos para o reconhecimento do subsídio, há que proceder à correção desse erro contabilístico de acordo com o procedimento da reexpressão retrospetiva previsto nos parágrafos 32 a 39 da NCRF 4.
Se existia informação disponível e acessível à empresa para determinar com razoabilidade e fiabilidade as condições subjacentes à atribuição do subsídio em causa não iriam ser cumpridas, e essa informação não foi tida em conta por lapso ou negligência, tal constitui um erro contabilístico que afetou resultados de períodos anteriores.
As correções de erros materiais em demonstrações financeiras de períodos anteriores devem ser efetuadas através do procedimento de reexpressão retrospetiva, conforme previsto na NCRF 4 - Políticas contabilísticas, alterações nas estimativas contabilísticas e erros.
Quando esses erros afetem resultados de períodos anteriores, sendo situações materialmente relevantes, devem ser imputados à conta de resultados transitados e implicar a reexpressão retrospetiva desde o período comparativo mais antigo apresentado, conforme previsto nos parágrafos 32 a 39 da NCRF 4.
Apenas podem ser utilizadas as contas de perdas e ganhos do período corrente (correções de exercícios anteriores), quando os erros respeitarem a situações que não sejam materialmente relevantes, não sendo importante a reexpressão retrospetiva para a análise da informação comparativa das demonstrações financeiras, não se aplicando, portanto, os procedimentos da NCRF 4.