Um imperativo de transparência
12 Outubro 2011
A. Domingues de Azevedo
Estamos a poucos dias de um dos mais aguardados momentos do ano: a apresentação do Orçamento do Estado (OE) para 2012. 

É desse documento que dependerá o que famílias, empresas e o próprio Estado vão planear em termos de despesas, receitas, investimento e poupança. Contudo, sem conhecer os contornos do OE é difícil fazer previsões do que nos espera em termos concretos, mas já é possível avançar, facto garantido pelos próprios governantes, que será o mais severo de todos os tempos e de difícil execução.

O país, em termos de gestão das contas públicas, bateu no fundo. Mas, há que dizê-lo, por culpa de governantes e governados. Urge inaugurar uma nova era, operando uma revolução no Estado para se criar um modelo com maior transparência e rigor na aplicação dos dinheiros públicos. 

Portugal habitou-se, passivamente, a contemplar o governo e os seus responsáveis políticos como algo distante, inacessível e fechado numa redoma de vidro. O tempo veio provar que os cidadãos têm direito a uma informação atempada, sustentada e sem subterfúgios. Já agora, credível. 

Atualmente a vida pública não é transparente, estando subordinada a entendimentos, estratégias e objetivos que muitas vezes resvalam para o campo dos interesses particulares. Em abono da verdade, hoje não há nem orçamento, nem contas públicas, mas sim um emaranhado de valores dispersos que ninguém controla e a que ninguém responsabiliza. 

A contabilidade pública e o OE deveriam refletir o país de forma fiel, mas tal não acontece. Usa-se e abusa-se das práticas de desorçamentação em praticamente todos os setores. Não espanta, portanto, que os buracos surjam com enorme frequência. Por mais sacrifícios que se imponham, o rumo do crescimento económico não tem pernas para andar. 

Perante esta situação é crucial que o Estado português mude a sua organização e gestão financeira de forma radical. Em nome de um imperativo de transparência. Essa alteração cultural deve começar na cabeça dos cidadãos e estender-se aos que exercem funções de caráter público.

Os últimos anos confirmaram que o grau de responsabilização dos governantes, seja na administração central, local ou regional, é quase nulo. Limita-se a um castigo nas urnas, e quando existe. As consequências criminais ou de inabilitação de cargo público por um período de tempo ainda são apenas ideias distantes de execução prática.

O terreno tornou-se fértil para a instalação da desresponsabilização na vida pública portuguesa. Com agravante de quem paga a fatura, com esforços que já roçam a fronteira do insuportável, serem os de sempre: os cidadãos. Os gastos injustificados e desmesurados dos políticos penalizam, em primeiro lugar, as pessoas. É nesta altura de emergência nacional que a sociedade se deve mobilizar e exaltar o valor da cidadania para repudiar a irresponsabilidade, a incompetência e o aventureirismo. Pôr as contas públicas em ordem é um trabalho sempre inacabado e exige responsabilidade e seriedade no exercício dos mandatos políticos. 

Quem desempenha funções de relevo na sociedade deve regularmente explicar o que anda a fazer, como faz, por que faz, quanto gasta e o que vai fazer a seguir.

Saúda-se o esforço do Primeiro-Ministro em procurar dizer a verdade aos portugueses, mas temo que as estruturas que suportam a gestão pública não estejam à altura da boa vontade de Passos Coelho. 

Voltaremos ao tema depois de conhecido o Orçamento.

Artigo escrito de acordo com a nova grafia