PT22507 – Venda de viatura
06-05-2019
Um automóvel entrou como «doação ou cedência do carro do sócio à empresa.» A empresa nada pagou ao sócio e a operação ficou registada na conta 278811 conta sócio, que está credora (ano 2018). O automóvel ficou registado pelo valor de mercado na altura, ou seja, 7 190 euros (2018). Agora, o sujeito passivo em questão quer reaver o automóvel. Qual será melhor a solução: emitir uma fatura ao sócio pelo valor que falta amortizar e depois anular as amortizações que já foram feitas?Parecer técnico
A questão colocada refere-se ao enquadramento contabilístico da transferência de uma viatura de ativo da entidade para a propriedade do sócio. Aviatura em causa tinha sido doada, no ano de 2018, pelo mesmo sócio.
No que se refere à doação, é de referir que o n.º 1 do artigo 940.º do Código Civil define que: «Doação é o contrato pelo qual uma pessoa, por espírito de liberalidade e à custa do seu património, dispõe gratuitamente de uma coisa ou de um direito, ou assume uma obrigação, em benefício de outro contraente.»
De acordo com o exposto estamos perante um particular (sócio) que fez uma doação de uma viatura à sociedade.
De acordo com este princípio previsto na estrutura conceptual, o beneficiário da doação pode reconhecer como ativos os itens doados, nos termos do tratamento respetivo previsto nas normas contabilísticas e de relato financeiro (NCRF) do SNC ou da norma contabilística para microentidades.
Como contrapartida do reconhecimento desse ativo, a empresa beneficiária de tal doação pode não reconhecer um ganho no resultado do período, decorrente dessa entrega gratuita, refletindo-a diretamente como um ganho do capital próprio.
A contabilização de doações pode ser efetuada por contrapartida a crédito de uma conta de classe 5 que registará as doações recebidas (conta 594 – Doação, conforme código de contas aprovado pela Portaria n.º 218/2015, de 23 de julho).
Em termos de mensuração, não existindo um valor de contrapartida pela obtenção da viatura, pode eventualmente utilizar-se o justo valor da viatura à data da doação para a determinação dessa mensuração. Esse justo valor pode ser determinado pelo custo corrente do usufruto da viatura, ou seja, pelo valor que teria de pagar pela aquisição da viatura em condições similares.
Assim sendo, no ano de 2018, o registo contabilístico deveria ter sido:
- Débito da conta 43 - Ativos fixos tangíveis por contrapartida a crédito da conta de classe 594 - Doações, pelo justo valor da viatura (de acordo com a informação o valor de mercado era de 7 190 euros).
De notar que a entrega gratuita da viatura à sociedade daria lugar a uma variação patrimonial positiva que concorre para a formação do lucro tributável, nos termos do n.º 2 do art.º 21.º do CIRC.
No entanto, em 2018, o registo contabilístico pela aquisição da viatura foi o reconhecimento de um ativo por contrapartida de um passivo (434/278). Considerando este registo, podemos concluir que, o registo contabilístico não reflete que se tratou de um donativo. Para todos os efeitos, o sócio ficou credor do valor da viatura (7 190 euros).
No que toca à alienação, os itens do ativo fixo tangível deverão ser desreconhecidos pela respetiva quantia escriturada, sempre que os mesmos já não desempenhem qualquer função para a empresa ou não sejam suscetíveis de proporcionar benefícios futuros, independentemente de estarem ou não totalmente depreciados, ou então, sejam alienados, conforme refere o parágrafo 66 da referida NCRF.
A venda de um ativo fixo tangível deverá originar um cálculo extra contabilístico para apuramento da mais-valia ou menos-valia, sendo este cálculo resultado da diferença entre o valor de venda do ativo e o valor líquido contabilístico (quantia escriturada) do mesmo bem.
Desde modo, tratando-se da venda de uma viatura, classificada como ativo fixo tangível, os cálculos poderão ser:
MVc / mvc = VR - (Vaq.(ou Vreav) - DAc/PIac)
Em que:
MVc / mvc - Mais-valia contabilística /menos-valia, contabilística
VR - Valor de realização
Vaq - Valor de aquisição
Vreav - Valor de reavaliação
DAc - Depreciações acumuladas contabilizadas
PIac - Perdas por imparidade acumuladas contabilizadas
Os registos contabilísticos podem ser:
Pela anulação das depreciações acumuladas:
- Débito da conta 438 – Depreciações acumuladas, por contrapartida a crédito da conta 434 – Equipamento de Transporte, pelo montante das depreciações acumuladas da viatura.
Pelo desreconhecimento da viatura:
- Débito da conta 278x – Outros devedores e credores, pelo valor de realização;
- Débito da conta 6871 – Gastos e perdas em investimentos não financeiros – Alienações, pela diferença negativa (menos-valia) entre o valor de realização e a quantia escriturada do imóvel (se fosse o caso);
Por contrapartida a:
- Crédito da conta 434 – Equipamento de transporte, pela quantia escriturada da viatura;
- Crédito da conta 7871 – Rendimentos e ganhos em investimentos não financeiros – Alienações, pela diferença positiva (mais-valia) entre o valor de realização e a quantia escriturada da viatura (se fosse o caso).
Assim sendo, pela alienação da viatura, deverá ser emitida uma fatura, pelo montante acordado para esta transação. Sugerimos que seja seguido o mesmo critério do momento da aquisição, ou seja, alienar a viatura utilizando o valor de mercado na data da alienação.
Em termos fiscais, na alienação de uma viatura, classificado como ativo fixo tangível, deverá ser determinada a mais ou menos-valia nos termos do artigo 46.º e seguintes do Código do IRC (CIRC).
De acordo com a conjugação das alíneas h) do n.º 1 do artigo 20.º, l) do n.º 1 do artigo 23.º, e ainda o n.º 1 do artigo 46.º, todos do CIRC, verificamos que o valor do rendimento ou do gasto que deve influenciar o lucro tributável não é o da mais ou menos-valia contabilística, mas sim o da mais ou menos-valia fiscal.
Atualmente, o n.º 2 do artigo 46.º do Código do IRC dispõe: «(...) as mais-valias e as menos-valias são dadas pela diferença entre o valor de realização, líquido dos encargos que lhe sejam inerentes e o valor de aquisição, deduzido das depreciações e amortizações aceites fiscalmente, das perdas por imparidade e outras correções de valor previstas nos artigos 28.º-A, 31.º-B e ainda dos valores reconhecidos como gasto fiscal nos termos do artigo 45.º-A prejuízo do disposto na parte final do n.º 3 do artigo 31.º-A.»
O enquadramento fiscal anterior das mais ou menos-valias fiscais, que estabelecia conceitos praticamente idênticos ao definido em termos contabilísticos, já não é bem assim, ou seja, a partir de 1 de janeiro de 2010, o que releva para efeitos de mais ou menos-valias fiscais são as depreciações fiscalmente aceites, significando que já são duas as diferenças em relação à fórmula de apuramento das mais ou menos-valias contabilísticas:
- Coeficiente de atualização - se tiverem decorrido pelo menos dois anos da data de aquisição até à data da alienação, conforme previsto no artigo 47.º do CIRC.
- Depreciações fiscalmente aceites
Fórmula para a determinação da mais ou menos-valia fiscal:
MV/mv = VR - (CA - DAac - PIAac) x coeficientes de desvalorização da moeda
Sendo:
MV - Mais-valia
mv - menos-valia
VR - Valor de realização líquido de encargos
CA - Custo de aquisição acrescido de encargos
DAac - Depreciações acumuladas aceite em termos fiscais (expeto no caso das viaturas ligeiras de passageiros em que são consideradas as depreciações acumuladas praticadas na contabilidade)
PIA - Perdas por imparidade acumuladas aceites em termos fiscais
De acordo com o entendimento da Circular n.º 6/2011 no ponto 3.21: «Face à ratio subjacente à imposição de limites ao reconhecimento de gastos com este tipo de bens quando o respetivo valor de aquisição ou de reavaliação ultrapassa determinado montante, a interpretação mais consentânea com essa ratio é considerar que, para efeitos de determinação das respetivas mais-valias ou menos-valias, o valor das depreciações que releva é o das praticadas na contabilidade.»
mv fiscal dedutível = valor limite / valor de aquisição x mv fiscal
No caso de se apurar uma menos-valia fiscal, deve ser aplicado o disposto na alínea l) do n.º 1 do artigo 23.º A do Código do IRC, considerando-se que a parcela da menos-valia fiscal passível de ser deduzida como gasto é a proporcional ao valor fiscalmente depreciável, ou seja:
- Importa ainda referir que para demonstrar o modo como foi calculada a mais ou menos-valia contabilística e a mais ou menos-valia fiscal realizada na alienação da viatura (ou em qualquer outra situação do n.º 1 do artigo 46.º do CIRC), a empresa deve ainda preencher o mapa modelo 31 - Mapa das mais-valias e menos-valias, e em conformidade com o artigo 130.º do CIRC e com a Portaria n.º 92-A/2011, de 28 de fevereiro, esse mesmo mapa deve integrar o dossiê fiscal.