Pareceres
Correções a exercícios anteriores
15 Junho 2023
Parecer técnico elaborado pelo departamento de consultoria da Ordem.

Correções a exercícios anteriores
PT27504 - março de 2023

 

Ao analisar os saldos de fornecedores de um cliente de um gabinete de contabilidade, determinado contabilista certificado deparou-se com saldos de anos anteriores aos quais não foi dada liquidação, mas assegurando o cliente que os valores foram pagos.
Não existem documentos que o comprovem (cheques, transferência bancária identificada no extrato bancário e/ou recibo), mas o facto é que os fornecedores continuaram a fornecer o cliente no ano seguinte (2022), o que parece indicar que de facto os pagamentos foram feitos.
Foram solicitados extratos aos fornecedores, mas nem todos responderam. Por outro lado, não se trata de adiantamentos no caso dos saldos devedores de fornecedores.
Como o objetivo é regularizar estes saldos de abertura e após todas as tentativas para conseguir identificar os movimentos, como proceder a estas regularizações da conta de fornecedores (e eventualmente de clientes) em termos contabilísticos?
Quais as contas a movimentar para “limpar” estes valores?

 

Parecer técnico
 

O pedido de parecer está relacionado com a regularização dos saldos de clientes e fornecedores.
No caso apresentado a entidade apresenta saldos e, aberto nas contas de clientes e fornecedores. Após conciliação com as entidades conclui-se que os montantes já foram pagos.
Considerando que não é indicado o normativo contabilístico adotado pela entidade, iremos abordar esta temática no âmbito das normas contabilísticas e de relato financeiro (NCRF) previstas no aviso n.º 8 256/2015, de 29 de julho. Em todo o caso, o tratamento contabilístico é comum em todos os normativos.
Começamos por referir que a contabilidade deve basear-se nas operações realizadas no período, com o objetivo de se preparar e apresentar demonstrações financeiras que contenham a posição financeira e o desempenho económico verificado nesse período, independentemente de outros formalismos legais.
Estando perante situações em que os saldos das contas não refletem a imagem verdadeira e apropriada, é necessário proceder aos ajustamentos ou correções de erros nas demonstrações financeiras.
Para tal, sugerimos que seja solicitado ao órgão de gestão todos os elementos contabilísticos e explicações que se entendam necessários, de modo a deixar claro as razões que levaram às divergências detetadas. Recomendamos que todas as diligências sejam reduzidas a escrito, para salvaguarda da responsabilidade profissional, enquanto contabilista certificado.
Em termos globais, o procedimento correto para se efetuarem regularizações nas demonstrações financeiras das entidades é a realização de reconciliações de todas as contas e rubricas do balanço, com o objetivo de se identificarem erros, negligências e documentos ou registos em falta.
Para a realização das reconciliações das contas é conveniente efetuar uma circularização de saldos de contas correntes com as entidades externas com que a empresa se relaciona, nomeadamente com os clientes, fornecedores, entidades bancárias, o Estado (Finanças e Segurança Social) e outros devedores e credores.
Deve ainda proceder-se à contagem física dos ativos físicos detidos pela empresa, nomeadamente ativos fixos tangíveis, inventários, caixa, etc..
Outro procedimento contabilístico fundamental é a realização das reconciliações bancárias das contas de depósitos à ordem.
O objetivo destes procedimentos (circularização, contagens físicas, reconciliações) é a identificação de possíveis diferenças entre os registos contabilísticos e a realidade relacionada com as entidades externas ou com os itens físicos detidos ou locados, podendo a seguir serem solicitados os documentos em falta ou esclarecimentos das operações em aberto que estejam em dúvida.
Em resultado da reconciliação de todas as contas, com a identificação de todas as diferenças relativas a erros, documentos em falta ou outras omissões na contabilidade é possível efetuar as necessárias regularizações com o propósito de colocar as demonstrações financeiras da empresa com uma imagem verdadeira e apropriada da respetiva posição financeira e desempenho, sendo este um dos objetivos principais a ter em conta na preparação e apresentação dessa informação financeira.
Nos casos em que as demonstrações financeiras não estão de acordo com a realidade, a correção deverá ser prospetiva de acordo com a NCRF 4. Os erros de períodos anteriores são corrigidos na informação comparativa apresentada nas demonstrações financeiras desse período posterior.
De acordo com o parágrafo 5 da NCRF 4 - Políticas contabilísticas, alterações nas estimativas contabilísticas e erros, consideram-se erros de períodos anteriores as omissões, e declarações incorretas, nas demonstrações financeiras da entidade de um ou mais períodos anteriores decorrentes da falta de uso, ou uso incorreto, de informação fiável que estava disponível quando as demonstrações financeiras desses períodos foram autorizadas para emissão e poderia razoavelmente esperar-se que tivesse sido obtida e tomada em consideração na preparação e apresentação dessas demonstrações financeiras. De acordo com o parágrafo 33 da NCRF 4, com o parágrafo 6.10 da NCRF-PE e com o parágrafo 6.8 da NCRF-ME, a correção de um erro material de um período anterior é excluída dos resultados do período em que o erro é detetado, sendo efetuada diretamente em resultados transitados.
De acordo com o parágrafo 31 da NCRF 4, parágrafo 6.8 da NCRF-PE e parágrafo 6.6 da NCRF-ME, uma alteração de estimativa deve ser refletida prospectivamente, nos resultados do período em causa e em períodos futuros.
Em termos fiscais, o artigo 123.º do CIRC refere-se às obrigações contabilísticas das empresas, definindo a alínea b) do n.º 2 deste artigo que as operações devem ser registadas cronologicamente, sem emendas ou rasuras, devendo quaisquer erros ser objeto de regularização contabilística logo que descobertos.
Perante as diferenças detetadas, concluindo-se que as situações detetadas decorrem de erros contabilísticos que afetam gastos ou rendimentos de anos anteriores, haverá que proceder às correções dos saldos das contas sempre suportando os movimentos com documentos justificativos. Neste caso documentos assinados pela gerência, usando para tal a conta 56 - Resultados transitados se as correções assumirem grande relevo na informação veiculada pelas Demonstrações financeiras, ou as contas 6881/7881 - Correções relativas a períodos anteriores, no caso de correções favoráveis ou desfavoráveis resultantes de erros ou omissões relacionadas com exercícios anteriores que sejam pouco relevantes (vide parágrafo 6 da NC-ME - Politicas contabilísticas, alterações nas estimativas contabilísticas e erros, parágrafos 6.1 a 6.10) ou a NCRF 4.
Os valores registados a débito na conta 56 resultados transitados não representam variações patrimoniais negativas pelo que não devem ser inscritos no quadro 07 da declaração modelo 22.
No caso de vir a ser utilizada a conta 6881 ou 7881 os valores nela registados devem ser acrescidos ou deduzidos no quadro 07 da declaração modelo 22 por se considerar que os gastos de períodos anteriores não podem influenciar o resultado tributável do período em que foram efetuadas as correções.
Assim, no caso concreto, após a circularização com os fornecedores e clientes se conclui que os saldos não estão corretos, a entidade deve proceder à correção dos saldos por contrapartida das contas 6881 ou 7881 se considerar as diferenças materialmente poucos relevantes ou por contrapartida da conta 56 se considerar as diferenças materialmente relevantes.