Pareceres
Gastos fiscais e rendimentos em espécie
17 Outubro 2025
Parecer técnico elaborado pelo departamento de consultoria da OCC.

Gastos fiscais e rendimentos em espécie 
PT28685 - agosto de 2025

 

Um sócio-gerente de uma determinada empresa tem faturas de viagens e de alojamento em nome da empresa, pagas pela entidade para períodos de férias e não para deslocações para a atividade operacional. Como enquadrar? Considerar rendimento do sócio em termos de IRS e gasto fiscal com o pessoal/membros dos órgãos estatutários em termos de IRC?

 

Parecer técnico

 

As questões colocadas referem-se ao enquadramento, em sede de IRC, do pagamento de viagens particulares ao gerente de uma empresa.
Em sede de IRC, no tocante à aceitação fiscal, o número 1 do artigo 23.º do CIRC indica que «para a determinação do lucro tributável, são dedutíveis todos os gastos e perdas incorridos ou suportados pelo sujeito passivo para obter ou garantir os rendimentos sujeitos a IRC».
Assim, em primeiro lugar, para que um gasto seja aceite fiscalmente, terá o sujeito passivo de conseguir comprovar que o mesmo foi incorrido ou suportado para obter rendimentos sujeitos a IRC.
Contudo, no caso concreto, estando em causa despesas relacionadas com a vida particular do gerente, sem qualquer ligação com a atividade exercida pela ou através da sociedade, tais encargos, em circunstâncias normais, não serão aceites fiscalmente.
Sem prejuízo do referido no parágrafo anterior e tal como sugerido na questão, poderemos estar perante rendimentos do trabalho dependente (neste caso, rendimentos em espécie - partindo do pressuposto que a entidade pagou diretamente a viagem à agência, o que nos parece ter ocorrido no caso apresentado) na esfera do gerente desta empresa.
Isto porque o artigo 2.º do CIRS (rendimentos da categoria A - Trabalho dependente) determina que qualquer remuneração, paga ou colocada à disposição do trabalhador proveniente da relação laboral existente, independentemente da designação, periodicidade ou frequência e natureza, será tributada.
Ainda que não existindo norma que objetivamente se refira a determinada operação em concreto (pagamento de uma viagem de lazer) no n.º 3 do artigo 2.º do Código do IRS, teremos sempre de ter presente o disposto n.º 2 da mesma norma, face à natureza residual e, consequentemente, abrangente da mesma.
Neste sentido, o n.º 2 do artigo 2.º do Código do IRS dispõe que:
«As remunerações referidas no número anterior compreendem, designadamente, ordenados, salários, vencimentos, gratificações, percentagens, comissões, participações, subsídios ou prémios, senhas de presença, emolumentos, participações em coimas ou multas e outras remunerações acessórias, ainda que periódicas, fixas ou variáveis, de natureza contratual ou não.»
Refere ainda a alínea b) do número 3 do artigo 2.º do CIRS que:
«3 - Consideram-se ainda rendimentos do trabalho dependente:
(...)
b) As remunerações acessórias, nelas se compreendendo todos os direitos, benefícios ou regalias não incluídos na remuneração principal que sejam auferidos devido à prestação de trabalho ou em conexão com esta e constituam para o respetivo beneficiário uma vantagem económica (…).»
Pelo exposto, no caso em análise, caso a sociedade proceda ao pagamento de encargos afetos à esfera pessoal do gerente, como viagens e alojamento para férias, poderemos estar perante rendimentos do trabalho dependente atribuídos em espécie, na sua esfera pessoal, sujeitos a IRS nos moldes gerais, visto constituírem, na esfera deste, uma vantagem económica (cenário que, à partida, na nossa opinião, será o aplicável no caso concreto).
Neste caso, na medida em que os gastos sejam tributados na esfera pessoal do trabalhador como rendimentos de trabalho dependente, não se coloca qualquer problema na dedução em sede de IRC, sendo o gasto aceite nos termos da alínea d) do número 1 do artigo 23.º do CIRC, devendo os respetivos valores serem reconhecidos como gastos com o pessoal (conta 63X - Gastos com o pessoal).
Os rendimentos em espécie obtidos pelo trabalhador na situação em análise (partindo do pressuposto, mais uma vez, que a entidade pagou diretamente a viagem à agência), embora não sujeitos a retenção na fonte [alínea a) do número 1 do artigo 99.º do CIRS], deverão ser inscritos na DMR, visto não haver um código específico para o efeito, sob o código "A".
Em relação à Segurança Social, deverão tais valores, de acordo com o artigo 46.º do Código Contributivo, integrar, nos termos gerais, a base de incidência contributiva do gerente.