Pareceres
IRC / Despesas confidenciais e não documentadas
26 Julho 2024
Parecer técnico do departamento de consultoria da Ordem


PT28055 - IRC / Despesas confidenciais e não documentadas
Março de 2024


Qual a diferença entre despesas não documentadas e despesas não devidamente documentadas? Por exemplo, tendo um pagamento movimentado no extrato bancário e conseguindo identificar que foi feito numa bomba de gasolina, pode ser considerada como despesa não devidamente documentada?

Parecer técnico

A questão colocada refere-se ao tratamento contabilístico e fiscal de despesas identificadas no extrato bancário sem o referente suporte documental.

Começamos por referir que, contabilisticamente essas despesas devem ser reconhecidas, na respetiva conta de gastos, no período em que foram incorridos, mediante a informação que consiga obter, ou numa conta de gastos não especificados no caso de ser um gasto não documentado.

A norma geral de aceitação dos gastos fiscais, o artigo 23.º do CIRC, estabelece que são dedutíveis todos os gastos e perdas incorridos ou suportados pelo sujeito passivo para obter ou garantir os rendimentos sujeitos a IRC, portanto tais gastos terão de ser comprovados e verificar-se a sua conexão com rendimentos sujeitos a IRC.
No pressuposto de se conhecer a natureza dos gastos, assim como, quais foram os destinatários dos mesmos significa que estamos perante gastos não devidamente documentados, e se assim for serão gastos não aceites fiscalmente nos termos da alínea c) do n.º 1 do artigo 23.º-A do CIRC e devem ser acrescidas no quadro 07 da modelo 22.
Outro cenário é se não se conseguir provar quais foram os destinatários que incorreram nos gastos, aqui já serão gastos não documentados e para além de terem de ser acrescidas no quadro 07 da modelo 22 estarão também sujeitas a tributação autónoma conforme se esclarece de seguida.

Neste contexto e para melhor compreensão expomos o enquadramento da seguinte dualidade: gastos não documentados e gastos não devidamente documentados.

1 - Gastos não documentados - não têm qualquer suporte documental
Por gastos não documentados entende-se todas as despesas incorridas em que não existe documento como prova da operação, nem se sabe o destino desses gastos e, portanto, não se consegue provar a natureza, finalidade e origem dos gastos. Por conseguinte as despesas não documentadas:
• Não cumprem o disposto nos números 1, 3 e 4 do artigo 23.º do CIRC (Gastos e perdas), pois não se consegue provar que os gastos foram incorridos para a obtenção de rendimentos.
• São encargos não dedutíveis nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 23.º-A (Encargos não dedutíveis para efeitos fiscais);
• São tributadas autonomamente, à taxa de 50% (ou 70% nas situações do n.º 2 do artigo 88.º do CIRC), e
• São acrescidas no quadro 07 da modelo 22, no campo 716.

2 - Gastos não devidamente documentados - têm um documento emitido por entidade externa, mas não reúne todas as condições legais exigidas
Ao contrário da primeira situação (gastos não documentados), os gastos não devidamente documentados admitem que haja documentação apesar da mesma apresentar insuficiências em alguns elementos, nomeadamente na comprovação da natureza da despesa.

O critério decisivo para diferenciar ambas as despesas é o fator "destino" do pagamento dos bens ou das prestações de serviços adquiridos, pois normalmente, apenas nas situações de gastos não devidamente documentados é que se conhece o destinatário, apesar destas operações carecerem da devida documentação. Por conseguinte os gastos não devidamente documentados:
• Não cumprem os requisitos dos números 3 e 4 do artigo 23.º do CIRC (Gastos e perdas);
• Não constituem um encargo dedutível ao abrigo da alínea c) do n.º 1 do artigo 23.º-A (Encargos não dedutíveis para efeitos fiscais) do CIRC;
• São acrescidos no quadro 07 da modelo 22, no campo 731.

Note-se no entanto, que ainda que sejam despesas não devidamente documentadas, as mesmas podem estar sujeitas a tributação autónoma, nomeadamente, se relativamente ao pagamento suportado pela sociedade (e que consta no extrato bancário), se conseguir provar a natureza da despesa e quem foi o destinatário (por exemplo através do e-fatura), e pressupondo que os gastos se referem por exemplo a despesas de representação, significa que tais gastos não devidamente documentados para além de não serem aceites fiscalmente são também sujeitos a tributação autónoma.