Pareceres
IRC - modelo 30 e agências de viagens
25 Março 2024
Parecer técnico elaborado pelo departamento de consultoria da OCC.

IRC - modelo 30 e agências de viagens
PT27913 – janeiro de 2024


Uma empresa, com sede em Portugal, tem um contrato com uma agência de viagens estabelecida num país da UE, a quem adquire voos, rent-a-car e estadias em hotéis, sejam estes em Portugal ou fora de Portugal.
A agência de viagens fatura à empresa portuguesa os serviços solicitados mais os fees de gestão.
Estas faturas deverão ser reportadas na declaração modelo 30 ou apenas os fees deverão ser reportados, dado tratar-se de uma comissão pelos serviços que nos prestam?


Parecer técnico


A questão colocada refere-se ao enquadramento fiscal, em sede de IVA e IR, relativamente ao pagamento de comissões cobradas por uma agência de viagens sediada num país da União Europeia pela venda de viagens e estadias.
No caso em concreto, segundo depreendemos do exposto na questão, poderemos estar perante pagamento de comissões a entidades pela gestão e venda de viagens e estadias dos trabalhadores da entidade portuguesa.
Face ao exposto, e não tendo sido especificado claramente na questão, entendemos que poderemos estar perante o pagamento de diversos serviços a entidades não residentes, nomeadamente:
- Comissões à agência de viagens, e
- Viagens e estadias propriamente ditas, e
Salienta-se que é importante definir com rigor os serviços que são prestados para que seja possível a sua inclusão em cada uma das regras destes preceitos do CIRS/CIRC.
Os nossos códigos fiscais (IRS e IRC), através da regra da territorialidade, patente no n.º 2 do artigo 15.º do Código do IRS e n.º 2 do artigo 4.º do Código do IRC, determinam que estão sujeitos a tributação em território nacional os rendimentos aqui obtidos por entidade (pessoa singular ou pessoa coletiva) que não tenha sede nem direção efetiva em território português.
A expressão «(...) rendimentos obtidos em território português(...)» é esclarecida pelo n.º 1 do artigo 18.º do Código do IRS e n.º 3 do artigo 4.º do Código do IRC, normas que enumeram as diversas situações que se consideram rendimentos obtidos em território nacional.
Numa leitura da alínea f) do n.º 1 do artigo 18.º do Código do IRS e da subalínea 6) da alínea c) do n.º 3 do artigo 4.º do Código do IRC, verificamos que os rendimentos provenientes de prestação de serviços de intermediação na celebração de contratos (comissões), quando obtidos por entidades não residentes, e pagos por sujeito passivo português se consideram rendimentos obtidos em território nacional e, como tal, estão aqui sujeitos a tributação.
Por outro lado, da subalínea 7) da alínea c) do n.º 3 do artigo 4.º do Código do IRC, consta:
«(...) 3 - Para efeitos do disposto no número anterior, consideram-se obtidos em território português os rendimentos imputáveis a estabelecimento estável aí situado e, bem assim, os que, não se encontrando nessas condições, a seguir se indicam:
(...)
c) Rendimentos a seguir mencionados cujo devedor tenha residência, sede ou direção efetiva em território português ou cujo pagamento seja imputável a um estabelecimento estável nele situado:
(...)
7) Os derivados de outras prestações de serviços realizados ou utilizados em território português, com exceção dos relativos a transportes, comunicações e atividades financeiras; (...).»
Face ao exposto, os rendimentos da prestação de serviços de transporte não se encontram abrangidos pela norma de sujeição.
As prestações de serviços de alojamento e refeições quando realizadas fora do território nacional também não se encontram abrangidas pela sujeição.
Face aos rendimentos em questão diremos que apenas os rendimentos provenientes de prestações de serviços de intermediação (comissões), quando pagos por sujeito passivo português a entidade não residente, são tributados mediante retenção na fonte a título definitivo, conforme resulta da conjugação da alínea g) do n.º 1 e do n.º 3, ambos do artigo 94.º do Código do IRC. A taxa a aplicar é de 25 por cento, conforme disposto na alínea a) do n.º 4 do artigo 71.º do Código do IRS e no corpo do n.º 4 do artigo 87.º do Código do IRC.
Não obstante a legislação nacional impor a tributação do rendimento em causa, importa sempre, quando estamos perante transações internacionais, aferir a existência, ou não, de acordo internacional. O artigo 101.º-C do Código do IRS e o artigo 98.º do Código do IRC referem-se, quanto à dispensa de efetuar retenção na fonte (ou efetuá-la a taxa reduzida), aquando do pagamento de determinado rendimento a entidade não residente quando tal resulte de acordo internacional.
Os acordos bilaterais que existem entre os Estados têm por objetivo eliminar ou atenuar a dupla tributação, estabelecendo regras comuns que conferem a determinado Estado legitimidade para tributar os rendimentos obtidos por um sujeito passivo que possui elementos de conexão entre os dois Estados.
Estas regras criam, diversas vezes, casos de dupla tributação. Desta forma, os Estados assinam entre si acordos bilaterais onde se estabelecem regras com o intuito de clarificar e simplificar a livre circulação de bens, pessoas e capitais, de modo a não dificultar as transações, eliminando ou atenuando a dupla tributação dos rendimentos. Assim, atendendo às operações em causa, acordam os Estados que determinado tipo de rendimento ou é isento, ou é tributado, ou é repartida a sua tributação, no Estado da fonte do rendimento ou no Estado de residência do beneficiário do rendimento.
O direito internacional impera sobre o direito interno, pelo que existindo convenção entre Portugal e o Estado de residência do beneficiário do rendimento, as regras da convenção aplicam-se (desde que a mesma seja devidamente acionada) em detrimento do direito interno.
Na questão em apreço, haverá que verificar se o beneficiário do rendimento reside em país com o qual Portugal celebrou a convenção para evitar a dupla tributação (CDT).
Por regra, resulta das CDT que, para o tipo de rendimentos em questão - prestação de serviços de intermediação (comissões) - será tributado no país de residência do beneficiário e não no país da fonte, conforme disposto no artigo 15.º e 7.º da generalidade das convenções, desde que a entidade beneficiária não tenha estabelecimento estável no país da fonte dos rendimentos, ou seja, os rendimentos derivados de prestações de serviços não serão tributados em Portugal e, por conseguinte, o respetivo devedor não procederá, relativamente aos mesmos, a qualquer retenção na fonte de imposto.
Assim, sempre que o sujeito passivo português, enquanto entidade pagadora de rendimentos a entidades não residentes (pessoas singulares ou pessoas coletivas) que queiram acionar a convenção, esteja na posse do formulário 21-RFI preenchido e do certificado de residência fiscal, deverá agir conforme o disposto na convenção em causa para os rendimentos obtidos.
De notar que, com a entrada em vigor da Lei n.º 119/2019, foram alterados os Códigos do IRS e do IRC, em particular no que se refere à prova da qualidade de não residente, sendo que tais alterações entraram em vigor e produziram efeitos a partir de 1 de outubro de 2019.
Na sequência da publicação deste diploma, o modelo 21-RFI foi alterado por intermédio do Despacho n.º 8363/2020, de 31 de agosto. A prova da qualidade de não residente, para efeitos do artigo 98.º do Código do IRC, passa a exigir, em conjunto, a apresentação de formulário modelo 21-RFI, acompanhado de documento emitido pelas autoridades competentes do respetivo Estado de residência que ateste a sua residência para efeitos fiscais no período em causa e a sujeição a imposto sobre o rendimento nesse Estado.
Assim, sempre que o sujeito passivo português, enquanto entidade pagadora de rendimentos a entidades não residentes que queiram acionar a convenção, esteja na posse do formulário 21-RFI e em simultâneo o certificado de residência, deverá agir conforme o disposto na convenção aplicável às operações entre os países em causa.
Os beneficiários dos rendimentos devem fazer prova perante a entidade que se encontra obrigada a efetuar a retenção na fonte, até ao termo do prazo estabelecido para a entrega do imposto que deveria ter sido deduzido, da verificação dos pressupostos que resultem de convenção para evitar a dupla tributação ou de um outro acordo de direito internacional ou ainda da legislação interna aplicável, através da apresentação de formulário de modelo a aprovar por despacho do membro do Governo responsável pela área das finanças, acompanhado de documento emitido pelas autoridades competentes do respetivo Estado de residência que ateste a sua residência para efeitos fiscais no período em causa e a sujeição a imposto sobre o rendimento nesse Estado, nos termos do n.º 2 do artigo 98.º
Ou seja, deverá sempre existir o formulário 21-RFI devidamente preenchido e o certificado de residência fiscal.
Atendendo ao anteriormente exposto, o modelo 21-RFI não precisa de ser autenticado pelas autoridades tributárias competentes, antes devendo estar devidamente preenchido (pelo entidade pagadora dos rendimentos) e assinado pelo titular dos rendimentos obtidos em Portugal, anexando a este respetivo documento emitido pelas autoridades competentes do respetivo Estado de residência que ateste a sua residência para efeitos fiscais no período em causa e sujeição a imposto sobre o rendimento nesse Estado.
Adicionalmente, para que a Autoridade Tributária e Aduaneira possa ter conhecimento dos rendimentos obtidos em território português por entidades não residentes sem estabelecimento estável, bem como para possibilitar algum controlo sobre as retenções efetuadas pelas entidades pagadoras, foi introduzida na legislação interna (n.º 7 do artigo 119.º do CIRS e artigo 128.º do CIRC) a obrigação de comunicação dos rendimentos pagos a sujeitos passivos não residentes em território português, através do preenchimento e envio da declaração Modelo 30.
A declaração modelo 30 deverá ser entregue até ao fim do segundo mês seguinte àquele em que ocorreu o pagamento ou a colocação à disposição dos rendimentos.
Nesta declaração, além de ser necessário evidenciar o tipo e montante dos rendimentos e da retenção na fonte associada, exige-se igualmente a identificação do regime de tributação utilizado, ou seja, exige-se que, sempre que seja indicada uma taxa de retenção na fonte inferior às previstas na ordem interna portuguesa, seja indicado o motivo que a originou, como por exemplo, a aplicação de uma convenção para evitar a dupla tributação em matéria de impostos sobre o rendimento.
De acordo com o disposto no Decreto-Lei n.º 14/2013, de 28 de janeiro [alínea a) do n.º 2 do artigo 11.º e artigo 12.º], as entidades residentes em território português que se encontrem obrigadas a proceder à retenção na fonte a título definitivo, aquando do pagamento a entidades não residentes, devem proceder à inscrição dessas entidades para efeitos de atribuição de número de identificação fiscal.
Por último, a referência ao disposto no artigo 129.º do Código do IRS: «(...) não se podem realizar transferências para o estrangeiro de rendimentos sujeitos a IRS obtidos em território português por sujeitos passivos não residentes sem que se mostre pago ou assegurado o imposto que for devido (...).» Norma equivalente em sede de IRC no n.º 1 do artigo 132.º do Código do IRC.