IRC - transparência fiscal em sociedade do ramo da saúde
PT27959 - fevereiro de 2024
Determinada sociedade no ramo da saúde, com dois sócios com quotas de 50 por cento cada, em que um é médico de medicina intensiva e o outro é técnico de neurocirurgia, é considerada uma sociedade profissional e por isso sujeita ao regime de transparência fiscal?
Parecer técnico
A questão colocada refere-se ao enquadramento fiscal, no âmbito de uma sociedade com atividade de medicina e cujo capital é detido por dois sócios com 50 por cento de participação cada, sendo que um sócio que exerce a atividade de medicina e outro a atividade de técnico de neurocirurgia. Concretamente, é questionado se poderá ficar abrangida pelo regime de transparência fiscal.
Resulta da alínea b) do n.º 1 do artigo 6.º do Código do IRC que o regime de transparência fiscal se aplica às sociedades de profissionais, sendo que, para estes efeitos existem dois conceitos de sociedades de profissionais.
Atualmente, dispõe a alínea a) do n.º 4 do artigo 6.º do Código do IRC:
«(...) a) Sociedade de profissionais:
1) A sociedade constituída para o exercício de uma atividade profissional especificamente prevista na lista de atividades a que se refere o artigo 151.º do Código do IRS, na qual todos os sócios pessoas singulares sejam profissionais dessa atividade; ou,
2) A sociedade cujos rendimentos provenham, em mais de 75%, do exercício conjunto ou isolado de atividades profissionais especificamente previstas na lista a que se refere o artigo 151.º do Código do IRS, desde que, cumulativamente, durante mais de 183 dias do período de tributação, o número de sócios não seja superior a cinco, nenhum deles seja pessoa coletiva de direito público, e pelo menos, 75% do capital social seja detido por profissionais que exercem as referidas atividades, total ou parcialmente, através da sociedade (...).»
Assim, para efeitos de enquadramento nos conceitos transcritos importa considerar quer a qualidade e número dos detentores das partes sociais e percentagem de capital detido, quer a proveniência dos rendimentos obtidos face às diversas atividades profissionais constantes na lista anexa ao artigo 151.º do Código do IRS, assim como o facto de os sócios exercerem, ou não a sua atividade profissional através da sociedade.
Pela interpretação da alínea a) do n.º 4 do artigo 6.º do Código do IRC, verificamos, que há duas noções distintas de sociedades profissionais.
Na primeira noção estaremos perante uma sociedade de profissionais se a mencionada sociedade foi constituída para o exercício de uma atividade profissional, especificamente prevista na lista anexa ao CIRS e todos os sócios da sociedade sejam pessoas singulares e que exerçam efetivamente tal atividade através da sociedade. No caso, se o sócio da sociedade for apenas sócio de capital não exercendo qualquer atividade profissional através da sociedade, esta não preenche os requisitos previstos na subalínea 1 da alínea a) do n.º 4 do artigo 6.º do CIRC.
Na segunda noção de sociedades de profissionais em que já não se exige que a sociedade exerça efetivamente apenas uma atividade profissional, admitindo-se que possa exercer várias atividades (profissionais ou não). Tal como se admite que os sócios possam ser profissionais de várias atividades das especificamente referidas na Lista a que se refere o artigo 151.º do CIRS e se admite também que possam existir sócios de capital.
Para efeitos desta análise, devemos desde logo ressalvar que é importante distinguir os rendimentos obtidos nas várias atividades exercidas. Na medida em que só existirá enquadramento no regime de transparência fiscal se das atividades exercidas, se mais de 75 por cento dos rendimentos obtidos provenham de atividades previstas na lista a que se refere o artigo 151.º do CIRS.
Importa referir que o enquadramento no regime de transparência fiscal é de aplicação obrigatória caso estejam reunidos os requisitos para tal, não resultando de uma opção do sujeito passivo.
O enquadramento no regime fiscal de transparência fiscal é efetuado em cada período de tributação, por cumprimento das referidas condições, não sendo um regime que se efetue qualquer indicação no cadastro, no momento da submissão da declaração início/alterações de atividade, sendo meramente indicado através da submissão da declaração de rendimentos modelo 22.
Chamamos a atenção que para efeito do enquadramento na transparência fiscal, o qua releva é efetivamente a atividade exercida, ou seja, a aferição não é efetuada pelo CAE da empresa. Sendo que as pessoas coletivas não utilizam os códigos do artigo 151.º do CIRS, mas sim os CAE previstas na Rev.3 CAE.
Em suma, para se aferir se a sociedade fica abrangida pelo regime da transferência fiscal não basta o conhecimento de que uma ou todas as atividades exercidas pela sociedade está prevista na lista anexa do CIRS, será necessário também que se cumpram (a 31 de dezembro) todos os requisitos daquela definição.
Na primeira definição: que a sociedade tenha sido constituída para o exercício de uma atividade da lista anexa ao artigo 151.º do CIRS (médicos) e todos os sócios da sociedade sejam profissionais dessa atividade e a exerçam através da sociedade, como parece ser o caso.
Na segunda definição, no caso de exercerem mais do que uma atividade:
- Mais de 75 por cento do rendimento da sociedade provém dos rendimentos da atividade da atividade da lista anexa ao artigo 151.º do CIRS; e
- Cumulativamente, durante mais de 183 dias do período de tributação (no caso de 2023):
• O número de sócios não foi superior a cinco;
• Nenhum deles foi uma pessoa coletiva de direito público; e,
• Pelo menos, 75 por cento do capital social foi detido por profissionais que exercem as referidas atividades, total ou parcialmente, através da sociedade.
Se se verificarem estas condições, a entidade será tributada com base no regime da transparência fiscal.
Por sua vez, de notar que, para ficar excluída do regime basta não preencher algum dos critérios de enquadramento até ao final do ano.
Face ao exposto, para poder verificar o enquadramento no regime de transparência fiscal, deve analisar-se a função ou atividades que os sócios desempenham na entidade e se tais atividades são as que são as que são referidas na lista anexa ao CIRS.
Tratando-se de prestação de serviços no âmbito da Medicina, estas atividades estão previstas na lista a que se refere o artigo 151.º do CIRS, com o código 70xx «Médicos...», a sociedade poderá ficar enquadrada no regime de transparência fiscal se, os dois sócios exercerem a atividade de medicina através da sociedade (subalínea 1) alínea a) do n.º 4 do artigo 6.º do Código do IRC), ou, no caso da sociedade exercer outras atividades para além da medicina, se em determinado exercício, mais de 75 por cento dos seus rendimentos provirem de operações relacionadas com função de médicos e os dois sócios médicos ou atividades paramédicas (100 por cento do capital) exercerem a atividade de medicina na sociedade (subalínea 2) alínea a) do n.º 4 do artigo 6.º do Código do IRC).