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IRS - afetação de imóveis
30 Junho 2022
IRS - afetação de imóveis
Junho de 2022

Uma solicitadora/agente de execução exerce a atividade em regime de contabilidade organizada, tendo adquirido em 2015 um escritório por 62 400 euros que, de imediato, afetou à atividade empresarial. Não pretende vender nem afetar ao património pessoal, pelo menos a curto prazo. Tem, até à data, amortizações acumuladas de 5 500 euros, pelo que devem ter falhado algumas amortizações. Qual o regime mais favorável?

Parecer técnico

O pedido de parecer está relacionado com o regime transitório previsto no artigo 369.º da Lei 75.º-B/2020, de 31 de dezembro (Lei OE/2021).
Atendendo à questão colocada, assumimos que a dúvida se prende com o preenchimento da declaração modelo 3, em particular a opção que o sujeito passivo deve exercer no quadro 7 do anexo C da modelo 3.
As alterações introduzidas pela Lei do Orçamento do Estado para 2021 eliminaram, desde 1 de janeiro de 2021, as mais-valias na afetação de imóveis à categoria B e na transferência de imóveis da categoria B para o património particular do empresário. No novo regime, só haverá tributação de mais-valias aquando da venda do imóvel a um terceiro.
Mas em 1 de janeiro de 2021 havia imóveis a ser utilizados na atividade empresarial por muitos sujeitos passivos de IRS. E havia mais-valias com tributação suspensa desde a afetação. Como no caso da colega. Por isso, a necessidade de um regime transitório.
O artigo 369.º da Lei do OE/2021 consagrou um regime transitório, sendo que, nos termos do seu n.º 1, às mais-valias que se encontrem suspensas de tributação, por força da aplicação da alínea b) do n.º 3 do artigo 10.º e do n.º 9 do artigo 3.º do Código do IRS, é aplicável o novo regime de tributação.
Contudo, o n.º 2 do mesmo artigo permite que os sujeitos passivos que, à data de 1 de janeiro de 2021, tenham bens imóveis afetos à atividade empresarial e profissional, optem pelo regime anterior de apuramento de mais e menos-valias decorrentes da afetação de bens imóveis, devendo indicar essa opção na declaração periódica de rendimentos relativa ao ano de 2021 e identificar os imóveis afetos à atividade empresarial e profissional, bem como a data da sua afetação.
A questão concreta colocada é saber qual o regime mais favorável?
Ora, a essa questão não temos uma resposta, devendo cada contribuinte para cada situação concreta avaliar os diferentes cenários.
Sobre este tema sugerimos a leitura do manual da OCC com o título «Mais-valias na afetação e desafetação de imóveis», publicado na página da OCC no separador Formação/Materiais de apoio às formações.
Apesar de não ser questionado, alertamos para o seguinte:
No pedido de parecer, assumimos que estamos perante um trabalhador independente com contabilidade organizada. É referido que foi adquirido um imóvel e que até à data tem contabilizado amortizações acumuladas de 5 500 euros, dando nota que poderão eventualmente faltar o registo de algumas depreciações.
Atendendo a esta informação, consideramos importante dar nota do seguinte:
No caso em concreto, pressupomos que a entidade, no reconhecimento das depreciações dos ativos, utiliza o método da linha reta.
De acordo com as definições (parágrafo 6) da norma contabilística e de relato financeiro 7 - Ativos fixos tangíveis (NCRF 7), vida útil é:
- O período durante o qual uma entidade espera que um ativo esteja disponível para uso; ou
- O número de unidades de produção ou similares que uma entidade espera obter do ativo.
Segundo o parágrafo 50 da NCRF 7, a quantia depreciável de um ativo deve ser imputada numa base sistemática durante a sua vida útil. O parágrafo seguinte prevê que o valor residual e a vida útil de um ativo devem ser revistos pelo menos no final de cada ano financeiro e, se as expectativas diferirem das estimativas anteriores, a(s) alteração(ões) deve(m) ser contabilizada(s) como uma alteração numa estimativa contabilística de acordo com a NCRF 4 - Políticas contabilísticas, alterações nas estimativas contabilísticas e erros.
A vida útil de um ativo é definida em termos da utilidade esperada do ativo para a entidade, é uma questão de juízo de valor baseado na experiência da entidade com ativos semelhantes. A política de gestão de ativos da entidade pode envolver a alienação de ativos após um período especificado ou após consumo de uma proporção especificada dos futuros benefícios económicos incorporados no ativo, a vida útil de um ativo pode ser mais curta do que a sua vida económica.
A depreciação de um ativo começa quando este esteja disponível para uso, isto é, quando estiver na localização e condição necessárias para que seja capaz de operar na forma pretendida.
Nos termos do parágrafo 51 da NCRF 7, a estimativa da vida útil deve ser revista a cada data de balanço e, no caso de existirem alterações, estas devem ser contabilizadas como alterações de estimativas contabilísticas, nos termos do parágrafo 31 da NCRF 4. O efeito das alterações de estimativas contabilísticas deve ter um tratamento prospetivo, com inclusão desse efeito nos resultados do período corrente e períodos seguintes (e não afetando períodos anteriores).
Pelo exposto, a política de depreciações a utilizar deve resultar da expectativa da entidade face ao item em análise.
Assim, no caso em apreço, a partir do momento em que o imóvel está disponível para uso, deve ser depreciado atendendo à estimativa de vida útil considerada pela gestão, nos termos do parágrafo 55 da NCRF 7.
De notar que, enquanto os ativos estiverem disponíveis para utilização deve-se proceder ao reconhecimento da respetiva depreciação. Assim, no caso em concreto, a entidade não poderá deixar de reconhecer as depreciações em nenhum dos períodos posteriores ao período em que o imóvel ficou disponível para uso.
Não obstante, a estimativa da vida útil poderá se revista em cada período, atendendo à expectativa de utilização.
Nestes termos, eventuais alterações devem ser tratadas como alterações de estimativas contabilísticas, sendo tratadas de acordo com a NCRF 4. Isto significa que o gasto de depreciação do período corrente e dos períodos futuros deve ser baseado na estimativa de vida útil remanescente e/ou no valor ainda a depreciar em função da revisão do valor residual.
Se as estimativas iniciais do valor da vida útil foram feitas em respeito pelas definições constantes na NCRF 7, não se deve proceder a correções das depreciações de anos anteriores, uma vez que elas foram determinadas com base na melhor estimativa da vida útil dos bens. E essa estimativa foi, subsequentemente, alterada em função de planos de utilização dos bens ou de outros fatores.
A alteração de estimativa contabilística é aplicada de forma prospetiva, isto é, não afeta o passado, mas apenas o presente e o futuro, como referido. Ao revermos estimativas num período subsequente, não estamos a reconhecer a existência de qualquer erro na elaboração das contas de anos anteriores, mas apenas as alterações originadas por desenvolvimentos entretanto verificados.
Em termos contabilístico, a vida útil deve ser revista para o número de anos que a entidade estima utilizar os bens. Assim, no caso, se se concluir que se está perante a alteração de uma estimativa, a entidade pode calcular as depreciações do ano corrente e seguintes, com base na nova vida útil.
Tal como já referido, uma vez que se trata de uma alteração da estimativa, esta alteração apenas tem impacto no período atual e futuros.
Em termos fiscais, de acordo com o n.º 3 do artigo 1.º do Decreto Regulamentar (DR) n.º 25/2009, as depreciações são aceites como gastos fiscais desde que estejam contabilizadas no próprio período de tributação ou em períodos de tributação anteriores.
No entanto, é necessário atender aos períodos mínimos e máximos de vida útil:
- O período mínimo de vida útil, para efeitos fiscais, dos ativos depreciáveis é determinado pelas taxas de depreciação previstas nas tabelas anexas ao Decreto Regulamentar n.º 25/2009, ou pela estimativa de vida útil para algumas situações (itens adquiridos em estado de uso, grandes reparações, obras em edifícios alheios ou itens avaliados em reabertura de escrita), ambas relativas ao método das quotas constantes (artigo 5.º).
- O período máximo de vida útil, que corresponde à quota mínima de depreciação, corresponde ao dobro da vida útil determinada pelas duas situações referidas em cima. Esta quota mínima é metade da quota máxima, conforme previsto no artigo 18.º do Decreto-Regulamentar n.º 25/2009.
Quando tenha sido contabilizada uma depreciação de acordo com a estimativa do período de vida útil, nos termos da norma contabilística (por exemplo NCRF 7), mas que não tenha sido aceite em termos fiscais porque o período de vida útil estimado é inferior ao período útil mínimo determinado pelas taxas da tabela anexa ao Decreto Regulamentar n.º 25/2009, essas depreciações contabilizadas em excesso podem ser deduzidas ao lucro tributável em períodos posteriores, desde que não ultrapassem as quotas máximas de depreciação para esse bem, sem necessidade de efetuar qualquer outro procedimento.
O artigo 20.º do referido Decreto Regulamentar vem mesmo clarificar e indicar essa possibilidade.
«As depreciações e amortizações que não sejam consideradas como gastos fiscais no período de tributação em que foram contabilizadas, por excederem as importâncias máximas admitidas, são aceites como gastos fiscais nos períodos seguintes, na medida em que não se excedam as quotas máximas de depreciação ou amortização fixadas no presente decreto regulamentar.»
Ou seja, este período mínimo de vida útil corresponde à quota máxima de depreciação aceite em termos fiscais.
Não são aceites como gastos fiscais as depreciações contabilizadas que excedam o período máximo de vida útil, exceto se existir uma comunicação à Autoridade Tributária e Aduaneira, conforme previsto no n.º 5 do artigo 31.º-A do CIRC, efetuada até ao termo do período de tributação, na qual se identifiquem as quotas a praticar e as razões que justificam a respetiva utilização.
Existem quotas perdidas quando sejam efetuadas depreciações ou amortizações contabilizadas abaixo das quotas mínimas, sem a referida comunicação à AT ou sem que tal seja devidamente justificado.
A quota perdida é, então, a diferença negativa entre a quota mínima e a depreciação contabilizada. No caso de não serem contabilizadas depreciações (depreciações contabilizadas iguais a zero), então a quota perdida é igual à quota mínima.
Como se constata por estas regras fiscais, a entidade tem a opção de depreciar ou amortizar os seus itens do ativo fixo entre as quotas máximas e mínimas, sem qualquer necessidade de autorização ou comunicação à Autoridade Tributária e Aduaneira.
Passou, ainda, a ser possível, a partir de 2010, recuperar fiscalmente as depreciações contabilizadas superiores à quota máxima, podendo a parte que excede essa quota máxima, e que não foi aceite em termos fiscais, ser deduzida ao lucro tributável em períodos seguintes. Este procedimento não necessita de qualquer comunicação à Autoridade Tributária e Aduaneira ou de qualquer regularização contabilística.
É ainda possível depreciar os itens por uma quota inferior à quota mínima. No entanto, esse gasto apenas é aceite em termos fiscais, se comunicada à AT, com justificação fundamentada.
Nos termos do n.º 4 do artigo 30.º do CIRC deve ser aplicado o mesmo método de depreciação ou amortização, em relação a cada elemento do ativo, desde a sua entrada em funcionamento ou utilização até à sua depreciação ou amortização total, transmissão ou inutilização.
Todavia, este princípio de consistência na utilização do mesmo método de depreciação ou amortização (quotas constantes, degressivas ou outras) não prejudica a possibilidade de variação das quotas de depreciação ou amortização (entre a máxima e a mínima) de acordo com o regime mais ou menos intensivo ou com outras condições de utilização dos elementos a que respeitam, conforme previsto no n.º 5 do artigo 30.º do CIRC.
Face ao anteriormente exposto, no caso em concreto a alteração de estimativa da vida útil tem um tratamento prospetivo, sendo os seus efeitos aplicados no período corrente e seguintes. Não podem ser alteradas as depreciações de períodos anteriores.
Esta alteração da vida útil é aceite fiscalmente, desde que seja efetuada entre o período mínimo e máximo de vida útil, que é determinado em função da taxa de depreciação fiscal prevista nas referidas tabelas anexas ao Decreto Regulamentar n.º 25/2009.
Não obstante o anteriormente exposto, para o caso em concreto importa também dar nota do seguinte:
O parágrafo 12 da estrutura conceptual (EC) determina que «(...) o objetivo das demonstrações financeiras é o de proporcionar informação acerca da posição financeira, do desempenho e das alterações na posição financeira de uma entidade que seja útil a um vasto leque de utentes na tomada de decisões económicas (...).»
Por sua vez, o ponto 2.1.5 do anexo ao Decreto-Lei n.º 158/2009, de 13 de julho, diploma que aprovou o atual Sistema de Normalização Contabilística (SNC), dispõe que «(...) as demonstrações financeiras devem apresentar apropriadamente a posição financeira, o desempenho financeiro e os fluxos de caixa de uma entidade. A apresentação apropriada exige a representação fidedigna dos efeitos das transações, outros acontecimentos e condições, de acordo com as definições e critérios de reconhecimento para ativos, passivos, rendimentos e gastos estabelecidos na estrutura conceptual. Presume-se que a aplicação adequada das normas contabilísticas, com divulgação adicional quando necessária, resulta em demonstrações financeiras que alcançam uma apresentação apropriada (...).»
Retiram-se destes dois parágrafos a necessidade de que as demonstrações financeiras forneçam informação apropriada, portanto, entenda-se como fiel à realidade do sujeito passivo, devendo esta informação ser útil ao utente das demonstrações financeiras para a sua tomada de decisões.
Pelo exposto, existindo saldos que não correspondem à realidade, em virtude do reconhecimento de um valor de depreciação do período inferior ao que seria suposto (ou mesmo não terem sido reconhecidas as depreciações em determinados períodos), urge a sua regularização. O procedimento de correção deverá repor a verdade das demonstrações financeiras.
A respeito da correção de erros importa analisar o disposto na norma contabilística e de relato financeiro (NCRF) n.º 4 - Políticas contabilísticas, alterações nas estimativas contabilísticas e erros. De acordo com as definições constantes desta NCRF, erros de períodos anteriores «(...) são omissões, e declarações incorretas, nas demonstrações financeiras da entidade de um ou mais períodos anteriores decorrentes da falta de uso, ou uso incorreto, de informação fiável que: (a) estava disponível quando as demonstrações financeiras desses períodos foram autorizadas para emissão; e (b) poderia razoavelmente esperar-se que tivesse sido obtida e tomada em consideração na preparação e apresentação dessas demonstrações financeiras. Tais erros incluem os efeitos de erros matemáticos, erros na aplicação de políticas contabilísticas, descuidos ou interpretações incorretas de factos e fraudes (...).»
No que respeita à correção de um erro de um período anterior, esta deve ser excluída dos resultados do período em que o erro é descoberto, tal como prescrito no parágrafo 41 da NCRF n.º 4. Qualquer informação apresentada sobre exercícios anteriores, incluindo qualquer resumo histórico de dados financeiros, é reexpressa para períodos tão antigos quando tal seja praticável.
Pelo exposto, o movimento contabilístico da correção deste erro, de forma a repor a verdade das demonstrações financeiras, passará pelo débito na conta onde foram registadas as depreciações em excesso, eventualmente 438 - Ativos fixos tangíveis - Depreciações acumuladas, por contrapartida a débito na conta 56 - Resultados transitados (se for materialmente relevante) ou a débito da conta 688 (se for materialmente pouco relevante).
Quando os erros afetem as demonstrações financeiras de períodos anteriores, sendo situações materialmente relevantes e estejam relacionados com resultados, devem ser imputados à conta de resultados transitados. Apenas podem ser utilizadas as contas de resultados do período corrente (correções de exercícios anteriores), quando os erros respeitarem a situações que não sejam materialmente relevantes.
A questão da avaliação, se uma determinada operação (facto ou transação) é material, ou não, deve ser efetuada pela entidade em causa, não dependendo exclusivamente dos montantes em causa, mas também da natureza e dimensão das operações, e da situação económica e financeira da própria entidade, conforme previsto nos parágrafos 29 e 30 da estrutura conceptual do SNC. O que a entidade deve verificar, para efetuar esse juízo de valor na determinação da materialidade, é aferir se esse erro irá influenciar a tomada de decisão dos utilizadores das demonstrações financeiras.