IRS - residente não habitual
PT27737 - setembro de2023
Determinado residente não habitual tem um rendimento relativo a salários de 120 000 SGD em Singapura (e sem rendimentos em Portugal). Em maio de 2022, tornou-se residente em Portugal.
Qual o montante que deve ser declarado na modelo 3 de IRS? Caso não tenha de declarar o montante pela totalidade, qual é a fórmula de cálculo a utilizar?
No campo 8-C do rosto da declaração modelo 3, deve declarar-se alguma data ou deve manter-se o campo vazio?
Parecer técnico
A questão colocada refere-se ao preenchimento declarativo relativamente a um sujeito passivo que se tornou residente em 5 de maio de 2022 e obteve o estatuto de residente não habitual. No caso em concreto este sujeito passivo obtém rendimentos de trabalho dependente obtidos no estrangeiro.
Vigora em território nacional, a vulgarmente denominada regra da universalidade (ou de base mundial). Esta, em sede de IRS, consta do n.º 1 do artigo 15.º do CIRS, conforme se transcreve:
«(...) Sendo as pessoas residentes em território português, o IRS incide sobre a totalidade dos seus rendimentos, incluindo os obtidos fora desse território (...).»
Resulta desta norma que as pessoas singulares residentes em território nacional são aqui tributadas pela totalidade dos rendimentos que obtêm, ainda que existam rendimentos obtidos no estrangeiro (e independentemente do país onde possam ter sido obtidos). Esta sujeição a IRS é independente dos valores monetários correspondentes aos rendimentos obtidos ficarem depositados no país da fonte ou serem remetidos para Portugal.
O conceito de residência fiscal está previsto no n.º 1 do artigo 16.º do CIRS, que determina o seguinte:
«1 - São residentes em território português as pessoas que, no ano a que respeitam os rendimentos:
a) Haja nele permanecido mais de 183 dias, seguidos ou interpolados, em qualquer período de 12 meses com início ou fim no ano em causa;
b) Tendo permanecido por menos tempo, aí disponham, num qualquer dia do período referido na alínea anterior, de habitação em condições que façam supor intenção atual de a manter e ocupar como residência habitual;
c) Em 31 de dezembro, sejam tripulantes de navios ou aeronaves, desde que aqueles estejam ao serviço de entidades com residência, sede ou direção efetiva nesse território;
d) Desempenhem no estrangeiro funções ou comissões de carácter público, ao serviço do Estado Português.»
Com a reforma do IRS que entrou em vigor em janeiro de 2015 foi introduzido no CIRS um novo conceito, a residência fiscal parcial, na sequência da crescente globalização da atividade económica que tem, inevitavelmente, incrementado o número de situações em que, no decurso de um ano fiscal, pessoas individuais residem em dois ou mais países.
Assim, foi alterado o conceito de residente fiscal em território português, de modo a haver uma conexão direta entre o período de efetiva residência em território português e o estatuto de residente fiscal neste mesmo território.
Desta forma, as pessoas que preenchem uma das condições previstas nas alíneas a) ou b) do n.º 1 do artigo 16.º do CIRS tornam-se residentes desde o primeiro dia de permanência em território português (salvo quando tenham aí sido residentes em qualquer dia do ano anterior, caso em que se consideram residentes neste território desde o primeiro dia do ano em que se verifique qualquer uma das condições referidas).
Para efeitos de aplicação do conceito de residência, considera-se como dia de presença em território português qualquer dia, completo ou parcial, que inclua dormida no mesmo (n.º 2 do artigo 16.º).
Por seu turno, a perda da condição de residente ocorre a partir do último dia de permanência em território português (n.º 3 e 4 do artigo 16.º CIRS).
Tendo passado a vigorar, no âmbito do CIRS, a regra da tributação separada, passou a estabelecer-se, quanto à residência, que a mesma é aferida em relação a cada sujeito passivo do agregado (n.º 5 do artigo 16.º).
No mesmo sentido, o artigo 15.º do CIRS passou a prever, no seu novo n.º 3, que o âmbito de sujeição que distingue os residentes (tributação mundial - obrigação pessoal ilimitada) dos não residentes (princípio da fonte - obrigação real limitada aos rendimentos obtidos em território português) se aplica aos casos de residência parcial relativamente a cada um dos estatutos de residência.
Assim, sempre que, no mesmo ano, o sujeito passivo tenha, em Portugal, dois estatutos de residência (residente e não residente), deve proceder a entrega de uma declaração de rendimentos (quando aplicável) relativa a cada um deles, sem prejuízo da possibilidade de dispensa, nos termos gerais.
Em face do exposto, e respondendo em concreto à questão colocada:
- Se em 2022 o referido sujeito passivo teve em Portugal dois estatutos de residência (residente e não residente) deve entregar uma declaração modelo 3 relativa a cada um deles, sem prejuízo da dispensa prevista no artigo 58.º do CIRS:
- Na declaração modelo 3 relativa ao período em que foi residente fiscal em Portugal, declara a totalidade dos rendimentos auferidos nesse período, neste caso os rendimentos recebidos a partir de 5 maio 2022, incluindo os rendimentos obtidos no estrangeiro, sendo estes últimos incluídos no anexo J;
- Na declaração modelo 3 relativa ao período em que foi não residente fiscal em Portugal, declara os rendimentos obtidos em Portugal, nesse período, que não estejam sujeitos a retenção na fonte à taxa liberatória, nomeadamente, os rendimentos prediais;
No quadro 8 C da folha de rosto da declaração modelo 3 deve indicar o período a que cada uma das declarações respeita.
A condição de «residente não habitual» refere-se a uma pessoa singular que passa a ser residente em território português, contendo alguns benefícios associados a essa mudança de condição, de não residente para residente, para alguns rendimentos e mediante cumprimento de determinados requisitos.
Os benefícios podem ser aplicados em função da atividade exercida, podendo tal significar uma redução de tributação, ou isenção, para alguns rendimentos, mas não uma dispensa de obrigações, nomeadamente, de obrigações declarativas.
O Código Fiscal do Investimento, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 249/2009, de 23 de setembro, criou o regime fiscal para o residente não habitual em sede de IRS, tendo em vista atrair para Portugal profissionais não residentes qualificados em atividades de elevado valor acrescentado ou da propriedade intelectual, industrial ou know-how, bem como beneficiários de pensões obtidas no estrangeiro. A Tabela de atividades de elevado valor acrescentado consta na Portaria n.º 230/2019 de 23 de junho.
Obtido o estatuto de residente não habitual, o sujeito passivo adquire o direito a ser tributado em IRS como residente não habitual, pelo período de 10 anos consecutivos, com a respetiva inscrição dessa qualidade para efeitos cadastrais no registo de contribuintes da Autoridade Tributaria (n.º 9 do artigo 16.º do Código do IRS).
O gozo do direito a ser tributado como residente não habitual em cada ano do período referido requer que o sujeito passivo seja considerado residente em Portugal para efeitos do IRS (n.º 11 do artigo 16.º do Código do IRS) podendo, no entanto, caso não tenha gozado daquele direito num ou mais anos do período, retomar o gozo do mesmo em qualquer dos anos em falta para terminar os 10 anos, contando que nele volte a ser considerado residente para efeitos de IRS (n.º 12 do artigo 16.º do Código do IRS).
Trata-se, pois, de um direito que o sujeito passivo adquire que não é obrigatório podendo o mesmo, caso o entenda e nada faça, ser tributado como residente, nos termos gerais.
O regime de tributação aplicável aos sujeitos passivos residentes não habituais caracteriza-se por:
Rendimentos auferidos em território nacional
- Não englobamento, para efeitos da sua tributação, salvo opção dos respetivos titulares, dos rendimentos líquidos das categorias A e B auferidos em território nacional em atividades de elevado valor acrescentado, com caráter científico, artístico ou técnico (n.º 10 do artigo 72.º do Código do IRS). Tais rendimentos serão sujeitos a tributação através de uma taxa especial de 20%.
O anexo L, destina-se a declarar os rendimentos auferidos por residentes não habituais em território português, em atividades de elevado valor acrescentado, com caráter científico, artístico ou técnico, destinando-se ainda a evidenciar a opção pelo método pretendido para eliminar a dupla tributação internacional relativamente àqueles rendimentos, bem como aos rendimentos das categorias E, F, G e H obtidos no estrangeiro.
Rendimentos obtidos no estrangeiro (opção método de Isenção)
- Opção pela aplicação do método da isenção relativamente aos rendimentos obtidos no estrangeiro das categorias E, F, G e da categoria B em atividades de prestação de serviços de elevado valor acrescentado, com caráter científico, artístico ou técnico, ou provenientes da propriedade intelectual ou industrial ou da prestação de informações respeitantes a uma experiência adquirida no setor industrial, comercial ou científico, desde que, alternativamente (conforme n.º 5 do artigo 81.º):
- Caso exista convenção para eliminar a dupla tributação celebrada por Portugal com o Estado da fonte, tais rendimentos possam ser tributados neste Estado;
- Caso não exista convenção para eliminar a dupla tributação celebrada por Portugal com o Estado da fonte, tais rendimentos possam ser tributados no outro país, território ou região, em conformidade com o modelo de convenção fiscal sobre o rendimento e o património da OCDE, interpretado de acordo com as observações e reservas formuladas por Portugal, desde que aqueles não constem de lista aprovada por portaria do membro do Governo responsável pela área das finanças, relativa a regimes de tributação privilegiada, claramente mais favoráveis e, bem assim, desde que os rendimentos, pelos critérios previstos no artigo 18.º, não sejam de considerar obtidos em território português.
- Opção pela aplicação do método de isenção relativamente aos rendimentos obtidos no estrangeiro da categoria A, quando:
Sejam tributados no outro Estado contratante, em conformidade com convenção para eliminar a dupla tributação celebrada por Portugal com esse Estado; ou
Sejam tributados no outro país, território ou região, nos casos em que não exista convenção para eliminar a dupla tributação celebrada por Portugal, desde que os rendimentos, pelos critérios previstos no n.º 1 do artigo 18.º, não sejam de considerar obtidos em território português
Nestes casos, e conforme o n.º 7 do artigo 81.º do CIRS, os rendimentos isentos, são obrigatoriamente englobados para efeitos de determinação da taxa a aplicar aos restantes rendimentos (exceto os rendimentos previstos nas alíneas c) a e) do n.º 1 e no n.º 6 do artigo 72.º do CIRS).
Rendimentos obtidos no estrangeiro (opção método de crédito de imposto)
O n.º 1 do artigo 81.º do CIRS dispõe:
«... 1 - Os titulares de rendimentos das diferentes categorias obtidos no estrangeiro, incluindo os previstos nas alíneas c) a e) do n.º 1 do artigo 72.º, têm direito a um crédito de imposto por dupla tributação jurídica internacional, dedutível até ao limite das taxas especiais aplicáveis e, nos casos de englobamento, até à concorrência da parte da coleta proporcional a esses rendimentos líquidos, considerados nos termos do n.º 6 do artigo 22.º, que corresponde à menor das seguintes importâncias:
a) Imposto sobre o rendimento pago no estrangeiro;
b) Fração da coleta do IRS, calculada antes da dedução, correspondente aos rendimentos que no país em causa possam ser tributados, líquidos das deduções específicas previstas neste Código (...).»
Neste sentido, o sujeito passivo deverá entregar juntamente com a sua declaração de rendimentos modelo 3, o anexo J, que se destina concretamente a declarar os rendimentos obtidos no estrangeiro, assim, como eventual imposto que já tenha sido pago noutro país, de modo que, a Administração Tributária e Aduaneira possa pôr em prática o mecanismo de dedução de imposto anteriormente referido.
O sujeito passivo deve ter na sua posse, para efeitos de apresentação, documento original comprovativo do montante do rendimento, da sua natureza e do pagamento do imposto, emitido ou autenticado pelas autoridades fiscais do Estado da proveniência dos rendimentos.
Ainda no caso dos contribuintes que tenham obtido rendimentos de fonte estrangeira com crédito de imposto, se estes não disponham, à data-limite para a entrega da declaração modelo 3, do documento comprovativo do montante do rendimento, da sua natureza e do pagamento do imposto final emitido ou autenticado pelas autoridades fiscais do respetivo Estado da fonte, deverão entregar dentro do prazo legal (ou seja de 1 de abril a 30 de junho) a declaração modelo 49. Com a entrega da modelo 49, o prazo limite para a entrega da declaração modelo 3 de IRS destes sujeitos passivos é alargado até ao dia 31 de dezembro.
Se estivermos perante rendimentos que não se enquadrem em nenhuma das situações elencadas anteriormente como tendo vantagem pelo estatuto de residente não habitual ou seja pelo método da isenção, serão tributados como "normais" contribuintes, sujeitos passivos residentes em território nacional, optando pelo método do crédito de imposto para eliminar a dupla tributação internacional.
Quanto aos rendimentos que este tenha auferido fora do território nacional em data anterior àquela em que se tornou residente fiscal, estes devem ser declarados no Estado no qual este era residente, não sendo de declarar em território nacional.
Os residentes não habituais, são em primeiro lugar residentes fiscais em Portugal, pelo que estão sujeitos à regra da universalidade prevista no n.º 1 do artigo 15.º do Código do IRS. Assim, se estivermos perante rendimentos que não se enquadrem em nenhuma das situações elencadas anteriormente como tendo vantagem pelo estatuto de residente não habitual, serão tributados como "normais" contribuintes, sujeitos passivos residentes em território nacional.
O anexo L destina-se a declarar os rendimentos auferidos por residentes não habituais em território português, em atividades de elevado valor acrescentado, com caráter científico, artístico ou técnico, tal como se encontram identificadas na tabela constante no fim destas instruções (categorias A e B), destinando-se ainda a evidenciar a opção pelo método pretendido para eliminar a dupla tributação internacional relativamente àqueles rendimentos, bem como aos rendimentos das categorias E, F, G e H obtidos no estrangeiro, como se refere no Quadro 6-B.
Face ao exposto, o sujeito passivo que detém o estatuto de residente não habitual é um sujeito passivo em território nacional e como tal, respeita as diversas normas previstas nos códigos, nos termos gerais, nestas circunstâncias é aqui que ele deve declarar a totalidade dos rendimentos obtidos, incluindo aqueles que proveem do estrangeiro (anexo J), atentos à regra da universalidade prevista no n.º 1 do artigo 15.º do Código do IRS.
Ora, para que seja possível determinar o tratamento fiscal destes rendimentos, é necessário em primeiro lugar identificar exatamente que tipo de rendimentos se trata e em segundo lugar aferir qual o seu enquadramento nos termos da convenção para evitar a dupla tributação (CDT) assinada entre Portugal e o país de fonte dos rendimentos.
Para o sujeito passivo de IRS, RNH em Portugal, optar pela aplicação do método da isenção ou do método do crédito de imposto, deverá preencher igualmente o quadro 6-B do anexo L.
Assim, tendo por base a informação acima exposta, estes rendimentos no que concerne à sua tributação em território nacional, poderá ocorrer da seguinte forma:
- Rendimentos da categoria A em atividades de elevado valor acrescentado, obtidos em Portugal, o sujeito passivo pode optar pelo não englobamento, sendo tais rendimentos sujeitos a tributação através de uma taxa especial de 20 por cento. Tais rendimentos devem ser declarados no anexo L.
Sobre matéria em análise, aconselhamos a leitura do documento emitido pela Autoridade Tributária e Aduaneira «Residente não habitual - RNH - Regime fiscal e anexo L do IRS.»
Por último, uma vez que na operação em análise a mesma não está emitida em euros, moeda legal em curso em Portugal, deverá atender-se ao disposto no artigo 23.º do Código do IRS:
«(...) 1 - A equivalência de rendimentos ou encargos expressos em moeda sem curso legal em Portugal é determinada pela cotação oficial da respetiva divisa, de acordo com as seguintes regras:
a) Tratando-se de rendimentos transferidos para o exterior, aplica-se o câmbio de venda da data da efetiva transferência ou da retenção na fonte, se a ela houver lugar;
b) Tratando-se de rendimentos provenientes do exterior, aplica-se o câmbio de compra da data em que aqueles foram pagos ou postos à disposição do sujeito passivo em Portugal;
c) Tratando-se de rendimentos obtidos e pagos no estrangeiro que não sejam transferidos para Portugal até ao fim do ano, aplica-se o câmbio de compra da data em que aqueles forem pagos ou postos à disposição do sujeito passivo;
d) Tratando-se de encargos, aplica-se a regra da alínea a).
2 - Não sendo possível comprovar qualquer das datas referidas no número anterior, aplica-se o câmbio de 31 de dezembro do ano a que os rendimentos ou encargos respeitem (...).»
No caso exposto, para efeitos de preenchimento do anexo J, deverá considerar os câmbios correspondem às regras estabelecidas no n.º 1 do artigo 23.º do Código do IRS.