IVA - autofaturação
PT28870 – outubro de 2025
Determinada empresa tem como cliente uma entidade espanhola que faz autofaturação. Não emitindo a empresa espanhola o ficheiro SAF-T, deve a empresa portuguesa emitir faturas no próprio programa de faturação com referência à fatura dos clientes, passando assim a constar no seu ficheiro SAF-T?
Parecer técnico
As questões colocadas referem-se ao enquadramento, em matéria de IVA, das obrigações relacionadas com a emissão de faturas por um cliente europeu de determinado sujeito passivo português.
Embora não seja referido qualquer pormenor relacionado com a existência de um acordo de autofaturação celebrado entre as partes, começamos por relembrar que, tal como resulta do número 14 do artigo 29.º e do número 11 do artigo 36.º, ambos do CIVA (que representam a transposição do artigo 224.º da Diretiva IVA), a emissão de faturas pelo adquirente dos bens ou serviços encontra-se, salvo algumas situações excecionais, dependente da existência de um acordo celebrado previamente para esse efeito, sem o qual tal procedimento não poderá ocorrer.
Aconselhamos, deste modo, a que se confirme tal pormenor junto dos intervenientes.
Antes de respondermos às questões concretas, aproveitamos para transcrever integralmente o artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 28/2019, de 15 de fevereiro, que refere o seguinte:
«1 - As faturas e demais documentos fiscalmente relevantes são emitidos pelos próprios sujeitos passivos, podendo ser elaborados pelos adquirentes dos bens ou serviços ou por um terceiro, em nome e por conta do sujeito passivo, sendo, nestes casos, o sujeito passivo transmitente dos bens ou prestador dos serviços responsável pela sua emissão e pela veracidade do seu conteúdo.
2 - A elaboração de faturas e demais documentos fiscalmente relevantes pelos próprios adquirentes dos bens ou dos serviços ou por terceiros que não disponham de sede, estabelecimento estável, ou domicílio em qualquer Estado-membro, está sujeita a autorização prévia da AT.
3 - Para obtenção da autorização prevista no número anterior, o sujeito passivo deve submeter à AT um pedido, por via eletrónica, no qual identifique o país terceiro onde pretende localizar o sistema informático de faturação e se responsabilize pela verificação continuada das seguintes condições:
a) O sistema informático de faturação e de contabilidade respeite os requisitos enunciados no artigo 11.º;
b) Seja utilizado um programa de faturação certificado nos termos previstos no artigo anterior;
c) Seja assegurado, através de terminais localizados em território nacional, o acesso em linha, o descarregamento e a utilização dos dados pela AT.
4 - A autorização prevista no n.º 2 é concedida quando, cumulativamente, se verifique que:
a) Existe com o país terceiro um mecanismo de trocas de informação ou cooperação administrativa no âmbito da fiscalidade;
b) O sujeito passivo não está em situação de incumprimento das obrigações de declaração de imposto e de pagamento relativas ao IVA e imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas (IRC) ou imposto sobre o rendimento das pessoas singulares (IRS), consoante o caso;
c) O sujeito passivo não tenha sido condenado pela prática de crimes fiscais.
5 - A AT pode, a todo o momento, cancelar a autorização mencionada nos números anteriores, caso se verifique o incumprimento das condições previstas no presente artigo.»
Assim, estando em causa, no caso concreto, um acordo de autofaturação celebrado com um cliente sediado em Espanha, visto tratar-se de um Estado-membro da União Europeia, como referido no número 2 deste artigo 5.º, o mesmo não carece de qualquer autorização prévia por parte da AT.
Contudo, aproveitamos para chamar a atenção de que o mesmo já não acontece relativamente a acordos de autofaturação com clientes de países terceiros, caso em que teria o sujeito passivo, como vimos, de solicitar uma autorização prévia à AT, sendo este pedido feito por via eletrónica.
Feitas estas notas introdutórias, tenha-se em conta o seguinte:
De modo a respondermos à questão concreta, socorrer-nos-emos do disposto no número 3 do artigo 35.º-A do CIVA, que refere o seguinte:
«3 - Não obstante o disposto no n.º 1, a emissão de fatura por sujeito passivo que não possua no território nacional a sua sede, estabelecimento estável ou, na sua falta, o domicílio a partir do qual a transmissão de bens ou prestação de serviços é efetuada, não está sujeita às regras estabelecidas no presente Código quando a obrigação de liquidação do imposto recai sobre o sujeito passivo adquirente dos bens ou destinatário dos serviços.»
Assim, estando em causa autofaturas elaboradas por adquirentes sujeitos passivos que não possuam no território nacional a sua sede, estabelecimento estável ou, na sua falta, o domicílio, desde que a obrigação de liquidação do imposto recaia sobre si (como, em princípio e embora nada seja referido sobre a natureza das operações, ocorrerá no caso concreto, partindo do pressuposto de que estamos perante prestações de serviços às quais é aplicável a regra de localização prevista na alínea a) do número 6 do artigo 6.º do CIVA, a contrario), então, a sua emissão não tem de respeitar as regras previstas no CIVA português e demais legislação complementar, pelo que poderão ser emitidas à luz das regras em vigor em Espanha.
Este entendimento é corroborado pelo Ofício-Circulado n.º 30 211/2019, de 15 de março, que contém, na sua oitava página, um quadro-resumo cuja análise se recomenda.
A confirmar-se o enquadramento referido nos parágrafos anteriores, na nossa opinião, tais documentos, embora tenham relevância contabilística (devendo, por isso, ser registados como se de uma fatura "normal" se tratasse), não revestem natureza de documentos fiscalmente relevantes, pelo que não terão de ser processados através de um programa de faturação certificado, nem conter Código QR nem ATCUD.
Para além disso, analisando, a contrario, o disposto no número 1 do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 198/2012, de 24 de agosto, os seus elementos também não terão de ser comunicados à AT, não sendo igualmente necessário comunicar qualquer acordo de autofaturação ou qualquer série no Portal das Finanças.
Salientamos ainda que estas operações, ao contrário do sugerido na questão, não deverão ser "replicadas" (ou reproduzidas) no programa de faturação do sujeito passivo, pois tal resultaria na duplicação de registos contabilísticos e, consequentemente, de rendimentos.
Em termos declarativos, visto estarmos perante operações ativas efetuadas a clientes sujeitos passivos sediados na União Europeia às quais será aplicável a regra de inversão do sujeito passivo por aplicação da alínea a) do número 6 do artigo 6.º do CIVA, a contrario, deverão tais valores ser refletidos no campo 7 do quadro 06 da declaração periódica.
Quanto à possibilidade de ser levantada alguma divergência entre a declaração periódica e o e-fatura, aconselhamos a que o sujeito passivo, numa ótica de proatividade e embora tal procedimento não seja obrigatório, remeta o acordo de autofaturação para a Autoridade Tributária através do e-balcão.
Nos termos da alínea i) do número 1 do artigo 29.º do CIVA deverá, ainda, ser entregue a declaração recapitulativa, correspondendo estas operações ao "tipo 5". Esta submissão deverá respeitar os prazos previstos no artigo 30.º do RITI.
Por fim, chamamos a atenção de que, caso não tenha fornecido esta informação na declaração de início de atividade, deverá o sujeito passivo entregar uma declaração de alterações, onde irá preencher o quadro 27, indicando, assim, que passou a efetuar serviços intracomunitários.
Refira-se que, nos termos do número 2 do artigo 32.º do CIVA, a declaração de alterações deve ser entregue no prazo de 15 dias a contar da data da alteração.
Poderá encontrar o modelo oficial da declaração de alterações nesta ligação.