Pareceres
IVA - Dedução
15 Setembro 2023
Parecer técnico elaborado pelo departamento de consultoria da OCC.


IVA - Dedução
PT27639 - julho de 2023

 

Em dezembro de 2021 foi recebida uma fatura correspondente ao fornecimento e instalação de painéis fotovoltaicos.
O fornecedor liquidou IVA na fatura, referente aos serviços descritos, as quais devem, por aplicação da alínea j) do n.º 1 do artigo 2.º do CIVA, ser emitidas sem liquidação de IVA, cabendo à adquirente proceder à respetiva liquidação (e eventual dedução), ficando o adquirente dos serviços impossibilitado de exercer o direito à dedução do IVA contido nestas faturas (conforme n.º 8 do artigo 19.º do CIVA).
O fornecedor não emitiu nota de crédito para correção da fatura emitida incorretamente com liquidação de IVA. O fornecedor não emitiu a fatura correta com IVA autoliquidação.
A fatura recebida em dezembro de 2021 nunca foi contabilizada, pelo facto de se aguardar a sua retificação, e não foi paga.
O fornecedor recorreu ao tribunal para receber a fatura e o adquirente teve de efetuar o pagamento em maio de 2023 da fatura emitida incorretamente com IVA liquidado e não contabilizada. Como proceder à contabilização da fatura emitida em dezembro de 2021, à data de hoje? O adquirente dos serviços fica impossibilitado de exercer o direito à dedução do IVA contido nestas faturas (conforme n.º 8 do artigo 19.º do CIVA), não sendo o IVA reconhecido como gasto, mas ficando na conta corrente do fornecedor?
É necessário proceder à liquidação do IVA, mesmo não sendo efetuada a sua dedução, ou seja, o Estado foi pago pelo IVA liquidado pelo emitente e irá receber agora pagamento do IVA liquidado pelo adquirente tendo um duplo benefício?

 

Parecer técnico

 

A questão colocada está relacionada com a aplicação da regra da inversão na prestação de serviços de fornecimento e montagem de painéis solares.
Começamos por referir que a presente questão foi previamente analisada por via telefone, tendo sido prestados alguns esclarecimentos adicionais.
Nos termos da alínea j) do n.º 1 do artigo 2.º do Código do IVA (CIVA) são sujeitos passivos de imposto «as pessoas singulares ou coletivas referidas na alínea a) que disponham de sede, estabelecimento estável ou domicílio em território nacional e que pratiquem operações que confiram o direito à dedução total ou parcial do imposto, quando sejam adquirentes de serviços de construção civil, incluindo a remodelação, reparação, manutenção, conservação e demolição de bens imóveis, em regime de empreitada ou subempreitada.»
Assim, a inversão do sujeito passivo aplica-se quando, cumulativamente, se verifiquem as seguintes condições:
- Se esteja na presença de aquisição de serviços de construção civil (englobando todo o conjunto de atos necessários à concretização de uma obra, independentemente do fornecedor ser ou não obrigado a possuir alvará ou título de registo nos termos da Lei n.º 41/2015, de 3 de junho, que estabelece o regime jurídico aplicável ao exercício da atividade da construção (revogando o Decreto-Lei n.º 12/2004, de 9 de janeiro e a Portaria n.º 19/2004, de 10 de janeiro);
- O adquirente ser sujeito passivo de IVA, em território nacional e, aqui pratique operações que confiram, total ou parcialmente, o direito à dedução do IVA.
Através do Ofício-Circulado n.º 30 101, de 24/05/2007, a Área de Gestão Tributária - IVA divulgou instruções administrativa sobre a aplicação da alínea j) do n.º 1 do artigo 2.º do CIVA, anexando os seguintes documentos:
- Anexo I, com lista exemplificativa (não exaustiva) de serviços aos quais se aplica a regra de inversão e
- Anexo II, com uma lista de serviços aos quais não se aplica a regra de inversão.
Assim, a inversão do sujeito passivo aplica-se quando, cumulativamente:
- Se esteja na presença de aquisição de serviços de construção civil, englobando todo o conjunto de atos necessários à concretização de uma obra (entendendo-se, no mencionado ofício, como obra «todo o trabalho de construção, reconstrução, ampliação, alteração, reparação, conservação, reabilitação, limpeza, restauro e demolição de bens imóveis, bem como qualquer outro trabalho que envolva processo construtivo»), independentemente do fornecedor ser ou não obrigado a possuir alvará ou título de registo, nos termos da Lei n.º 41/2015, de 3 de junho, que estabelece o regime jurídico aplicável ao exercício da atividade da construção; e
- Adquirente ser sujeito passivo de IVA, em território nacional e, aqui pratique operações que confiram, total ou parcialmente, o direito à dedução do IVA.
Através do Ofício-Circulado n.º 30 101, de 24 de maio de 2007, foram transmitidos esclarecimentos sobre a aplicação desta regra, designadamente:
- Que a mera transmissão de bens (sem instalação ou montagem por parte ou por conta de quem os forneceu) não releva para efeitos da regra de inversão (ponto 1.5.1).
- Que a entrega de bens, com montagem ou instalação na obra, se considera abrangida pela regra de inversão, desde que se trate de entregas no âmbito de trabalhos contemplados no anexo II da Lei n.º 41/2015 (que substituiu a Portaria n.º 19/2014), independentemente de o fornecedor ser ou não obrigado a possuir alvará ou título de registo nos termos da Lei n.º 41/2015 (que substituiu o Decreto-Lei n.º 12/2004).
- Excluem-se da regra da inversão os bens que, inequivocamente, tenham a qualidade de bens móveis, isto é, bens que não estejam ligados materialmente ao bem imóvel com caráter de permanência (ponto 1.5.3).
- A simples montagem de aparelhos que não façam parte integrante do edifício (elevadores a que se refere o n.º 39 do Despacho n.º 26 026/2006, de 21 de dezembro e aparelhos de ar condicionado ou de videovigilância funcionando isoladamente), não se encontra abrangida pela referida regra de inversão [alínea b) do ponto 1.5.4].
A questão será identificar se, de facto, se trata, ou não, de um aparelho que não faz parte integrante do edifício e que é simplesmente instalado no mesmo - o que depende da situação concreta.
Constam da lista I, anexa ao referido Ofício-Circulado, lista meramente exemplificativa de trabalhos a que se aplica a regra de inversão, «Sistemas de ar condicionado, de refrigeração, de aquecimento e de comunicação, que sejam partes integrantes do imóvel.»
No entanto, se está em causa a simples montagem de um aparelho de ar condicionado num imóvel onde já existe toda a pré-instalação inerente ao funcionamento deste equipamento, consubstanciando-se esta instalação na mera fixação do aparelho no local já devidamente preparado para o efeito, não estão reunidas as condições referidas naquele Ofício-Circulado pelo que não será aplicável a regra da inversão.
Avaliação idêntica terá de ser efetuada para a situação dos designados painéis solares, que, consoante o caso, podem ficar, ou não, abrangidos pela regra da inversão.
Não se aplicará a regra de inversão caso a instalação dos painéis solares consista na mera fixação, eventualmente a outros que possam já existir.
Por outro lado, poderá aplicar-se a regra de inversão caso os referidos painéis solares fiquem materialmente ligados ao imóvel com caráter de permanência, tendo subjacente alguma preparação (obra).
Face ao exposto, pressupondo que os painéis solares irão fazer parte integrante do imóvel, caso seja necessário a empresa executar serviços de construção civil para efetuar a respetiva montagem dos equipamentos, estamos perante:
- Uma operação de prestação de serviços «instalações» abrangida pela lista do anexo II da Lei 41/2015, pois os painéis solares enquadram-se como instalações elétricas. Sendo o adquirente um sujeito passivo ao abrigo da alínea j) do n.º 1 do artigo 2.º do CIVA, a empresa aplicaria a regra de inversão, devendo as faturas em causa, serem emitidas com a expressão «IVA – autoliquidação», em conformidade com o n.º 13 do artigo 36.º do CIVA.
Deste modo, se estivermos perante toda a montagem de um sistema de aproveitamento da energia para, por exemplo, aquecimento de águas, não haverá dúvida que tal sistema, que inclui os painéis solares, caldeiras (e tubagens interiores e exteriores) fazem parte do imóvel com carácter de permanência cumprindo assim com as condições para aplicação da regra de «IVA - autoliquidação.»
No entanto, se estivermos perante a simples montagem de equipamentos e, essa montagem não envolver trabalhos de construção civil, ou seja, tais equipamentos (painel solar) pela sua forma de colocação não fica materialmente ligado ao imóvel com caráter de permanência, então nesta situação não se pode aplicar a referida regra de «IVA - autoliquidação.»
Sugerimos ainda a consulta da informação vinculativa - Processo n.º 279, por despacho de 29 de janeiro de 2010, do SDG do IVA, que poderá consultar através do SICC, em: Doutrina/Informações vinculativas.
Feito este enquadramento da operação, a primeira opção do sujeito passivo será solicitar a correção da fatura ao prestador se serviços, considerando que estão reunidos todos os requisitos para a aplicação da regra de inversão.
Se o sujeito passivo fornecedor não retifica a fatura ou o adquirente assume o valor do imposto liquidado, o valor do IVA pago indevidamente não será custo fiscalmente aceite
Relativamente a esta operação, começamos por referir que, para uma entidade pessoa coletiva, a dedução de gastos terá de atender, antes de mais, ao disposto no artigo 23.º do Código do IRC, onde são elencados os gastos e perdas que podem ser deduzidos, referindo o seu n.º 1 que na determinação do lucro tributável (regime geral), são dedutíveis todos os gastos e perdas incorridos ou suportados pelo sujeito passivo para obter ou garantir os rendimentos sujeitos a IRC.
O artigo 23.º do CIRC dá primazia ao facto do gasto ser efetivamente incorrido no exercício da atividade do sujeito passivo.
Claro que existem ainda outras normas aplicáveis, como acontece, por exemplo, com as limitações do artigo 23.º- A do CIRC. Este artigo, na alínea f) do seu n.º 1, determina a não dedutibilidade fiscal de «impostos, taxas e outros tributos que incidam sobre terceiros que o sujeito passivo não esteja legalmente obrigado a suportar (...)» mesmo quando contabilizados como gastos do exercício.
Ou seja, se a entidade adquirente assumir o IVA contido na fatura indevidamente, não havendo lugar a retificação da fatura, não será gasto aceite fiscalmente.
Não obstante, o facto de a fatura ser erradamente emitida e liquidada, não altera a substância sob a forma da operação subjacente, ou seja, continua a ser serviços de construção civil, em que nos termos da alínea j) do n.º 1 do artigo 2.º do CIVA, o sujeito passivo da operação continua a ser o sujeito passivo adquirente.
Nos termos do artigo 16.º do CIVA, o valor tributável das transmissões de bens e das prestações de serviços sujeitas a imposto é o valor da contraprestação obtida ou a obter do adquirente, do destinatário ou de um terceiro.
Neste sentido, o valor tributável da operação, será o valor acordado do serviço, excluído do IVA pago indevidamente, uma vez que o mesmo não faz parte do serviço (e já foi entre que pelo prestador de serviço à Autoridade tributária e Aduaneira).
No que se refere à dedução, conforme o artigo 19.º do CIVA, só confere direito a dedução o imposto mencionado nos seguintes documentos, em nome e na posse do sujeito passivo em faturas passadas na forma legal. Consideram-se passadas na forma legal as faturas que contenham os elementos previstos nos artigos 36.º ou 40.º, consoante os casos.
No caso em concreto, a fatura contém todos os dados previsto no artigo 36.º do CIVA, pelo que não é o facto da descrição sobre a aplicação do IVA não estar corretamente efetuada que elimina o direito à dedução do sujeito passivo.
Por outro lado, nos termos do n.º 8.º do artigo 19.º do CIVA, os casos em que a obrigação de liquidação e pagamento do imposto compete ao adquirente dos bens e serviços, apenas confere direito a dedução o imposto que for liquidado por força dessa obrigação, o que se trata no caso em concreto.
Por fim, refira-se que o tratando-se de uma prestação de serviços o imposto é devido no momento da sua realização, nos termos previstos na alínea b) do n.º 1 do artigo 7.º do Código do IVA. Por sua vez, no caso de transmissão de bens, o imposto é devido e torna-se exigível aquando da sua colocação à disposição.
Tendo o serviço sido terminado em dezembro de 2022, o imposto tornou-se exigível nesse período, pelo que no caso em concreto deverá efetuar a substituição da Declaração Periódica de dezembro (o do 4.º trimestre), procedendo à liquidação e dedução do imposto referente aos serviços de construção civil adquiridos.