Pareceres
IVA - Documentos de transporte
5 Dezembro 2023
Parecer técnico do departamento de consultoria da Ordem

PT27759 - IVA - Documentos de transporte
Outubro de 2023


Determinada empresa, microentidade, tem como atividade, entre outras, a de limpeza de edifícios, tendo, para o efeito, diversos contratos de avenças mensais para limpeza de lojas comercias e edifícios habitacionais em diversos locais, alguns distantes uns dos outros. Como se compreende, tem de transportar os produtos e utensílios necessários para prestar os serviços. Quais os documentos de transporte que deve emitir para o transporte desses produtos e utensílios quando inicia o transporte na sede e também entre os locais de consumo, pois desloca-se entre esses locais sem vir à sede, e tendo em consideração que o consumo dos produtos em cada local de prestação dos serviços é parcial, relativamente às embalagens, transportando, assim, embalagens quase cheias e outras quase vazias?

Parecer técnico


O pedido de parecer está relacionado com os documentos de transporte que se devem utilizar nas deslocações efetuadas por um sujeito passivo cuja atividade é na área de limpeza de edifícios. É ainda esclarecido que nos bens transportados, para além de utensílios próprios (os quais entendemos serem partes integrantes do ativo fixo tangível do sujeito passivo) também se encontram matérias-primas utilizadas na prestação de serviços.

O Regime dos Bens em Circulação (RBC), aprovado pelo Decreto-Lei (DL) n.º 147/2003, de 11 de julho, regula a obrigatoriedade de emissão e os requisitos a que devem obedecer os documentos de transporte que devem acompanhar os bens objeto de operações realizadas por sujeitos passivos de IVA, quando colocados em circulação em território nacional.

Notamos que o referido DL tem sofrido diversas atualizações ao longo dos anos, tendo a última ocorrido com o Decreto-Lei n.º 85/2022, de 21 de dezembro.

A comunicação dos documentos de transporte está regulamentada na Portaria n.º 161/2013, de 23 de abril.
De acordo com o artigo 1.º do RBC, "[t]odos os bens em circulação, em território nacional, seja qual for a sua natureza ou espécie, que sejam objeto de operações realizadas por sujeitos passivos de imposto sobre o valor acrescentado deverão ser acompanhados de documentos de transporte processados nos termos do presente diploma."

Para o efeito, e nos termos do artigo 2.º do referido Regime, considera-se "documento de transporte" a fatura, guia de remessa, nota de devolução, guia de transporte ou documentos equivalentes.

Nos termos do n.º 2 do artigo 2.º do RBC, para efeitos do disposto no presente diploma "[c]onsideram-se "bens em circulação" todos os que se encontrem fora dos locais de produção, fabrico, transformação, exposição, dos estabelecimentos de venda por grosso e a retalho ou de armazém de retém, por motivo de transmissão onerosa, incluindo a troca, de transmissão gratuita, de devolução, de afetação a uso próprio, de entrega à experiência ou para fins de demonstração, ou de incorporação em prestações de serviços, de remessa à consignação ou de simples transferência, efetuadas pelos sujeitos passivos referidos no artigo 2.º do Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado (CIVA);
b) Consideram-se ainda "bens em circulação" os bens encontrados em veículos nos atos de descarga ou transbordo mesmo quando tenham lugar no interior dos estabelecimentos comerciais, lojas, armazéns ou recintos fechados que não sejam casa de habitação, bem como os bens expostos para venda em feiras e mercados (...)."
Adicionalmente, e com implicação no caso em análise, será de considerar as exclusões previstas no artigo 3.º do RBC, mediante o qual:
"1 - Excluem-se do âmbito do presente diploma: (...)
c) Os bens pertencentes ao ativo fixo tangível do remetente; (...)"
Face a esta exclusão, é nossa opinião que no caso em análise, no que se refere aos itens transportados, que integrem o ativo fixo tangível do sujeito passivo, não se mostra obrigatória a utilização de documento de transporte.
Contudo será de considerar o disposto nos números 3 e 4 do mesmo normativo:
3 - Relativamente aos bens referidos nos números anteriores, não sujeitos à obrigatoriedade de documento de transporte nos termos do presente diploma, sempre que existam dúvidas sobre a legalidade da sua circulação, pode exigir-se prova da sua proveniência e destino.
4 - A prova referida no número anterior pode ser feita mediante a apresentação de qualquer documento comprovativo da natureza e quantidade dos bens, sua proveniência e destino."

Para o efeito, nas viaturas poderá constar, por exemplo, uma declaração da entidade, com a discriminação destes itens, a atestar a sua não comercialização, bem como a comprovar que estes integram o ativo fixo tangível da entidade.

Por sua vez, no que se refere aos bens que irão ser integrados na prestação de serviços realizada, o que nos parece ser o caso de por exemplo, os produtos de limpeza, estes serão comercializados, ainda que indiretamente, via utilização na prestação de serviços. Admitimos que aquando dos vários transportes não exista um conhecimento objetivo de quantidades a utilizar em cada um dos clientes, pelo que remetemos para o n.º 6 do artigo 4.º do RBC.

Nos termos do n.º 6 do artigo 4.º do RBC, o transporte de bens sem que sejam conhecidos os destinatários dos bens transportados ou as quantidades a entregar, antes do início de transporte, deve ser acompanhado por um documento de transporte global, emitido e comunicado nos termos dos documentos de transporte iniciais.

No documento de transporte global não é incluída qualquer identificação de destinatário, nem o local de descarga, pois os mesmos não são conhecidos antes do início do transporte.

O documento de transporte global, emitido pela empresa proprietária dos bens, deve ser comunicado à AT antes do início do transporte. Esse documento de transporte global, ainda que seja comunicado por transmissão eletrónica de dados, com a respetiva obtenção do código de identificação, deve ser sempre impresso e acompanhar os bens transportados.

Esse documento de transporte global apenas não será comunicado à AT, antes do início do transporte, se o sujeito passivo tiver obtido um volume de negócios, no período de tributação anterior, igual ou inferior a 100.000 euros (conforme n.º 10 do artigo 5.º do RBC).
Face ao exposto, sempre que seja emitido um documento de transporte global, deve proceder-se do seguinte modo à medida que forem feitos os fornecimentos dos bens transportados, nos termos do referido n.º 6 do artigo 4.º do RBC:
"a) No caso de entrega efetiva dos bens, os documentos previstos no presente diploma, bem como a fatura simplificada a que se refere o n.º 1 do artigo 40.º do Código do IVA, devem ser processados em duplicado, utilizando-se o duplicado para justificar a saída dos bens;
b) No caso de saída de bens a incorporar em serviços prestados pelo remetente dos mesmos, deve a mesma ser registada em documento de transporte próprio, nomeadamente folha de obra ou outro documento equivalente."

Assim, nos termos da alínea a) é definido que à medida que os bens forem sendo entregues aos destinatários, há que proceder à emissão de um documento de transporte por cada entrega efetiva desses bens (ou fatura ou fatura simplificada), com menção expressa ao documento de transporte global original, e indicação do respetivo destinatário e quantidades de bens entregues.

Esse documento de transporte por cada entrega efetiva dos bens, incluídos no documento de transporte global inicial, pode ser processado por qualquer das vias previstas no n.º 1 do artigo 5.º do RBC. Essas faturas ou faturas simplificadas devem ser posteriormente recuperadas para o programa informático.

Como regra, os documentos de transporte de entregas efetivas, referentes a bens incluídos em documentos de transporte globais, devem ser inseridos no Portal das Finanças até ao 5.º dia útil seguinte ao do transporte.

Por sua vez, nos termos da alínea b), se o sujeito passivo transporta bens para os aplicar em obras ou em serviços prestados aos seus clientes, e não sabe, no início do transporte, que materiais aplicará em cada obra ou em cada cliente, o que entendemos ser o caso, deve adotar os procedimentos previstos nos n.ºs 6 e 7 do artigo 4.º do RBC, que passamos a transcrever.
"7 - Nas situações referidas nas alíneas a) e b) do número anterior, deve sempre fazer-se referência ao respetivo documento global.
8 - As alterações ao destinatário ou adquirente, ou ao local de destino, ocorridas durante o transporte, ou a não aceitação imediata e total dos bens transportados, obrigam à emissão de documento de transporte adicional em papel, identificando a alteração e o documento alterado."

Assim, na altura em que se inicia o transporte, os materiais devem ser acompanhados por um documento de transporte global, mencionando o destinatário, se for único ou referindo que os seus destinatários são desconhecidos, se forem vários.
Os elementos destes documentos de transporte deverão ser comunicados à AT, antes do início do transporte, nos termos dos n.ºs 5 e seguintes do artigo 5.º do RBC.

Quando os bens forem efetivamente incorporados nas obras ou nos serviços prestados, deve ser emitida, em duplicado, de acordo com a alínea b) do n.º 6 do artigo 4.º, folha de obra ou qualquer outro documento equivalente, no qual deverá sempre ser feita referência ao respetivo documento de transporte global.

De acordo com o disposto no n.º 11 do mesmo artigo 4.º, os elementos constantes das folhas de obra são comunicados, por inserção no Portal das Finanças, até ao 5.º dia útil seguinte ao do transporte.

Em qualquer momento, os bens transportados devem coincidir com a diferença entre os bens mencionados no documento de transporte global e os bens mencionados nas referidas folhas de obra.

De referir que o documento de transporte global terá de ser emitido todas as vezes que uma viatura sai das instalações da empresa, com bens destinados a ser incorporados em serviços prestados aos clientes.

A este respeito, notamos que a Autoridade Tributária e Aduaneira se pronunciou sobre um tema idêntico na Ficha Doutrinária Processo: n.º 5530, por despacho de 2013-10-04, do SDG do IVA, por delegação do Diretor Geral.

Conclui a AT na referida Ficha Doutrinária que "23. (...) os bens em circulação, produtos de limpeza a incorporar nas prestações de serviços de limpeza de edifícios, devem ser acompanhados do respetivo documento de transporte, emitido e comunicado à AT em conformidade com o disposto no Regime de bens em circulação.
24. Nos casos referidos em que os produtos de limpeza são transportados por um "supervisor" de zona, não existindo conhecimento prévio dos bens que vão ser aplicados em cada local de destino, deve ser emitido documento global, nele fazendo referência aos produtos em circulação e registar em documento adicional, nomeadamente folha de obra, a saída dos bens a incorporar nas prestações de serviços, de modo que os bens em circulação sejam os elencados no documento global, menos os bens que, entretanto, foram incorporados nas respetivas prestações de serviços, ainda que as quantidades utilizadas não respeitem as unidades completas transportadas.
25. Conforme já referido nos pontos 18 e 19 da presente informação, os elementos dos documentos globais devem ser comunicados à AT antes do início do transporte enquanto os referentes aos documentos adicionais devem ser comunicados até ao 5.º dia útil seguinte ao do transporte."

Face ao exposto, e respondendo à questão colocada, entendemos que os bens que incorporem o ativo fixo tangível do sujeito passivo não necessitam de ser acompanhado de documento de transporte. Contudo, entendemos que na viatura deverá existir uma declaração da entidade, com a discriminação destes bens, a atestar a sua não comercialização, bem como a comprovar que estes integram o ativo fixo tangível da entidade.

Por sua vez, quanto aos produtos que serão incorporados nos serviços de limpeza, entendemos que os mesmos devem ser acompanhados por um documento de transporte global, desde o momento em que se inicia o transporte, mencionando o destinatário, se for único ou referindo que os seus destinatários são desconhecidos, se forem vários.

Quando os bens forem efetivamente incorporados nos serviços prestados, deve ser emitida, em duplicado, folha de obra ou qualquer outro documento equivalente a mencionar a saída dos bens, no qual deverá sempre ser feita referência ao respetivo documento de transporte global.