PT27295 - dezembro de 2022
Determinado sujeito passivo português inicia atividade de prestação de serviços de informática, com previsão aproximada de volume de negócios no valor de 40 mil euros, ficando enquadrado em IVA no regime normal trimestral e em IRS no regime simplificado, sendo a morada de estabelecimento igual à morada fiscal residente em Portugal.
A prestação de serviço é realizada por via eletrónica em Portugal a entidades adquirentes dos serviços com residência/estabelecimento em países da União Europeia (UE) e no exterior, ou seja, fora da comunidade, sendo que, por vezes, há entidades que têm, para efeitos de IVA, entidade representante em Portugal.
Em sede de IVA, a faturação a emitir aos clientes de países comunitários e aos países do exterior será isenta de IVA mencionando «IVA autoliquidação».
Em sede de IRS, à faturação emitida a partir do valor de 12 500 euros, será de efetuar retenção de IRS à taxa de 25 por cento ou pode o fornecedor do serviço apresentar certificado de residência ou formulário 21/RFI?
O rendimento auferido, sendo o prestador de serviços residente em Portugal, é declarado e tributado em Portugal, sendo de aplicar o coeficiente de 75 por cento aos rendimentos para apuramento da matéria coletável?
O prestador de serviços desloca-se, por vezes, para outros países da comunidade, onde exerce a atividade também por via eletrónica [mantendo a residência em Portugal]. A tributação em IVA mantém-se mencionando «IVA autoliquidação».
Em Portugal pode declarar-se em IRS o valor de despesa com renda no exercício da atividade. Pode, na mesma, declarar em IRS o valor de despesa com a renda que tem quando está em trabalho nos países da comunidade?
Parecer técnico
A questão colocada refere-se ao enquadramento fiscal em sede de IRS e IVA relativamente à prestação de serviços por parte de um sujeito passivo português a sujeitos passivos localizados na UE e países terceiros.
Atendendo a que o sujeito passivo em causa exerce uma atividade independente como pessoa singular, a partir do território português (o seu Estado de residência), mais concretamente, de serviços de informática, nestes termos terá entregado a respetiva declaração de início de atividade, quer para efeitos de IVA quer para efeitos de IRS, aplicando-se-lhe a partir daí todas as obrigações destes sujeitos passivos conforme o enquadramento que venha a ter.
IRSAtendendo que no caso em concreto, o TI terá clientes localizados fora de Portugal, em termos de imposto sobre o rendimento, devemos atender às regras de tributação.
Em sede de IR, determinam os nossos códigos fiscais (ver artigo 15.º do CIRS) que os sujeitos passivos residentes em território nacional são tributados pela totalidade dos rendimentos obtidos, incluindo aqueles que provêm de outros territórios (regra da universalidade ou de base mundial). Por sua vez, os sujeitos passivos, entidades não residentes, são tributados de acordo com a regra da territorialidade, isto é, apenas serão tributados os rendimentos aqui obtidos.
É devido à existência destas duas regras de tributação (universalidade e territorialidade) nos diversos Estados, que ocorre a dupla tributação de rendimentos.
As convenções para evitar a dupla tributação internacional celebradas entre Portugal e outros Estados estabelecem regras para minimizar ou mesmo eliminar esta dupla tributação, referindo, no entanto, que em relação a determinados rendimentos pode a tributação ocorrer nos dois Estados, competindo ao Estado de residência a eliminação da dupla tributação internacional.
Este mecanismo da eliminação opera através da dedução ao imposto liquidado no Estado de residência de um quantitativo igual ao do imposto pago no outro Estado, até ao limite da fração do imposto liquidado no Estado da residência correspondente aos rendimentos auferidos no estrangeiro, calculado antes da dedução.
Para outras situações, nos termos estabelecidos nas mesmas convenções, alguns rendimentos são exclusivamente tributados no Estado da fonte (local onde são obtidos), pelo que deve o Estado de residência considerar esses rendimentos apenas para efeitos de englobamento e determinação da taxa a aplicar, sendo os mesmos isentos de tributação nesse Estado.
Outros rendimentos, ainda, são exclusivamente tributados no Estado de residência, pelo que, nestes casos, Portugal (como Estado de residência) não é obrigado a deduzir qualquer imposto pago indevidamente no Estado da fonte.
Atendendo a que falamos de um sujeito passivo residente em Portugal (que, como vimos, será tributado pela globalidade dos rendimentos obtidos), este, tem de englobar todos os rendimentos obtidos, os rendimentos auferidos pela prestação de serviços a uma entidade não residente, terá sempre de ser incluída do anexo J, mesmo que não tenha outros rendimentos a declarar.
Sendo o serviço prestado a entidade não residente, o rendimento poderá aí ficar sujeito a retenção nos termos da legislação desse país, já que é esse o Estado da fonte do rendimento (mas não se aplicam as regras de retenção vigentes em Portugal).
Existindo Convenção para evitar a dupla tributação celebrada entre Portugal e esses Estados, há a considerar que por norma no seu artigo 14.º que determinam que os rendimentos derivados do exercício de profissão liberal são apenas tributados no Estado de residência do profissional (a menos que seja exercida no outro Estado através de estabelecimento estável nesse território, o que entendemos não ser aqui o caso).
Como tal, deve o trabalhador independente português acionar a Convenção naquele Estado (para o que terá de questionar as autoridades fiscais americanas) por forma a que lhe seja aí dispensada a retenção do imposto, uma vez que este terá de ser englobado na declaração de modelo 3 a entregar em Portugal (anexo J).
Para acionar a convenção o TI, o sujeito passivo português, deve proceder à entrega da certidão de residência fiscal, disponível através do Portal das Finanças, à entidade não residente devedora do rendimento.
IVA
Em sede de IVA, e como sujeito passivo deste imposto, fica sujeito às mesmas regras que os restantes sujeitos passivos, incluindo emissão de fatura (nos termos da alínea b) n.º 1 artigo 29.º do CIVA) e respetivas obrigações declarativas.
Tendo em conta que os titulares dos rendimentos em causa são obrigados a emitir fatura, recibo ou fatura-recibo, em modelo oficial, de todas as importâncias recebidas, conforme dispõe o n.º 1 do artigo 115.º do Código do IRS ou a emitir fatura nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 29.º do Código do IVA e a emitir documento de quitação de todas as importâncias recebidas.
Resulta da alínea b) do n.º 1 do artigo 29.º do Código do IVA que:
«(...) 1 - Para além da obrigação do pagamento do imposto, os sujeitos passivos referidos na alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º devem, sem prejuízo do previsto em disposições especiais: (...)
b) Emitir obrigatoriamente uma fatura por cada transmissão de bens ou prestação de serviços, tal como vêm definidas nos artigos 3.º e 4.º, independentemente da qualidade do adquirente dos bens ou destinatário dos serviços, ainda que estes não a solicitem, bem como pelos pagamentos que lhes sejam efetuados antes da data da transmissão de bens ou da prestação de serviços.»
Pelo anteriormente exposto, como regra geral temos que os sujeitos passivos, em termos genéricos, encontram-se abrangidos pela obrigatoriedade de emitir fatura por cada transmissão de bens ou prestação de serviços realizada.
Por estarmos perante um sujeito passivo de IRS, o empresário em causa poderá, aquando da prestação de serviços, emitir faturas e recibos (ou faturas-recibo) no Portal das Finanças, em conformidade com a alínea a) do n.º 1 do artigo 115.º do CIRS, este procedimento já existe desde 1 de janeiro de 2016, face legislação dada pela Portaria n.º 338/2015, de 8 de outubro.
Este diploma "aprova os novos modelos de fatura, de recibo e de fatura-recibo, bem como as respetivas instruções de preenchimento, de acordo com as novas redações do artigo 115.º do Código do IRS e do artigo 29.º do Código do IVA, e revoga a Portaria n.º 426-B/2012, de 28 de dezembro"
O artigo 2.º do diploma (Portaria n.º 338/2015, de 8 de outubro) transmite-nos o seguinte:
«(...)
Artigo 2.º Âmbito de aplicação
1 - São obrigados à emissão de fatura, recibo ou fatura-recibo, nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 115.º do Código do IRS, os sujeitos passivos de IRS titulares de rendimentos da categoria B:
a) Pelas transmissões de bens e prestações de serviços referidas nas alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 3.º do Código do IRS;
b) Pelas importâncias recebidas dos seus clientes, ainda que a título de provisão, adiantamento ou reembolso de despesas; e
c) Pelos rendimentos indicados na alínea c) do n.º 1 do artigo 3.º do Código do IRS.
2 - Em alternativa, os titulares destes rendimentos podem dar cumprimento às obrigações de emissão de fatura e de documento de quitação nos termos previstos na alínea b) do n.º 1 do artigo 115.º do Código do IRS.
3 - Os sujeitos passivos que pratiquem um ato isolado, nos termos do n.º 3 do artigo 3.º do Código do IRS, podem cumprir a obrigação de faturação no Portal das Finanças nos termos do n.º 21 do artigo 29.º do Código do IVA, através da emissão de uma fatura e de um recibo ou de uma fatura-recibo. (...).»
Em alternativa à emissão de faturas, recibos ou faturas-recibos no Portal das Finanças, e de acordo com o ponto 2 do artigo 2.º do Diploma, o empresário poderá cumprir a obrigação de faturação nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 115.º do CIRS, que remete para a alínea b) do n.º 1 do artigo 29.º do CIVA. Ou seja, emitir uma fatura (e posteriormente o recibo de quitação) por cada transmissão de bens ou prestação de serviços.
Sendo as faturas, recibos ou faturas-recibo, emitidas em nome de um adquirente que não possua residência, sede, direção efetiva ou estabelecimento estável a que deva imputar-se o pagamento, em território português, os rendimentos não se encontram sujeitos a retenção na fonte, devendo o requerente indicar no respetivo documento «Sem retenção - não residente sem estabelecimento.»
Em referência ao modo de utilização do Código do IVA, importa em primeiro lugar enquadrar a entidade e a operação praticada face às normas de incidência subjetiva (artigo 2.º do Código do IVA) e objetiva (artigo 1.º do Código do IVA). Posteriormente, teremos de aferir da territorialidade ou localização da operação - artigo 6.º do Código do IVA - de modo a determinar em que local deverá a operação ser sujeita a tributação. Determinado o local da tributação deve, então, aferir-se da existência de normas de isenção que se apliquem ao caso.
Assim, no caso em análise, depois de confirmada a sujeição objetiva (tratar-se de prestações de serviços) e subjetiva (os prestadores de serviços serem sujeitos passivos) das operações, deve analisar-se a territorialidade da operação. Para o efeito importa considerar o disposto no n.º 6 e seguintes do artigo 6.º do Código do IVA.
Existem, assim, duas regras de localização das operações definidas no n.º 6 do artigo 6.º do CIVA, ou seja, são tributáveis em território nacional as prestações de serviços a:
- Sujeitos passivos de IVA em território português, cuja sede, estabelecimento estável ou, na sua falta, o domicílio, para o qual os serviços são prestados, se situe no território nacional, onde quer que se situe a sede, estabelecimento estável ou, na sua falta, o domicílio do prestador [alínea a) do n.º 6 do artigo 6.º do CIVA];
- Às pessoas que não sejam sujeitos passivos de imposto (particulares), quando o prestador tenha no território nacional a sede da sua atividade, um estabelecimento estável ou, na sua falta, o domicílio, a partir do qual os serviços são prestados [alínea b) do n.º 6 do artigo 6.º do CIVA]. Daqui resulta, que:
- Pela alínea a) do n.º 6 do artigo 6.º do CIVA, a localização da operação será no lugar da sede, estabelecimento estável ou domicílio do adquirente, isto desde que estejamos perante serviços prestados a sujeitos passivos, denominados de Business to Business (B2B), ou seja, serviços que tenham como destinatários sujeitos passivos de IVA.
- Pela alínea b) do n.º 6 do artigo 6.º do CIVA, a localização da tributação será no lugar da sede, estabelecimento estável ou domicílio do prestador, isto, se estivermos perante serviços prestados a não sujeitos passivos de IVA, ou seja, prestações de serviços que tenham como destinatários não sujeitos passivos de IVA (pessoa particular ou coletiva que não seja sujeito passivo de IVA), operações denominadas de Business to Consumer (B2C).
As regras gerais patentes no n.º 6 do artigo 6.º do CIVA podem ser afastadas por aplicação das regras de exceção dos números seguintes da mesma norma. Assim, determinadas prestações de serviços devidamente identificadas devem ser enquadradas, caso as suas condições se verifiquem, nas normas (de territorialidade) em que as mesmas se inserem.
Nos números 7 e 8 do artigo 6.º do CIVA temos as exceções às duas regras gerais e nos números 9, 10 e 11 as exceções à regra geral das prestações de serviços efetuadas por sujeitos passivos a não sujeitos passivos.
Assim, estando em causa prestações de serviços que não se enquadrem em nenhuma das exceções referidas no n.º 7 e n.º 8 do artigo 6.º do CIVA, efetuadas por um sujeito passivo português a um sujeito passivo dos Estados Unidos, aplicar-se-á a regra geral prevista na alínea a) do n.º 6 do artigo 6.º do CIVA, nos termos da qual as referidas prestações de serviços se localizam e são tributáveis nos Estados Unidos.
Face ao exposto e respondendo concretamente à questão colocada, o sujeito passivo português deve emitir as faturas sem IVA e com a menção «IVA – autoliquidação».
Em termos de obrigações declarativas, sendo o adquirente sujeito passivo na UE deverá relevar as prestações de serviços no campo 7 do quadro 06 da declaração periódica, assim como relevar a operação na declaração recapitulativa porque a tributação foi deslocalizada para o Estado-membro do adquirente, de acordo com a regra geral da alínea a) do n.º 6 do artigo 6.º do CIVA.
Em termos declarativos, as prestações de serviços realizadas a sujeitos passivos localizados em países terceiros deverão ser incluídas no campo 8 do quadro 06 da declaração periódica.