Investimentos financeiros e registos contabilísticos
Julho / 2023
A sociedade por quotas “A” é detida por outras três sociedades por quotas (sociedade “B”, sociedade “C” e sociedade “D”).
A sociedade “B” detém 50 por cento do capital da sociedade “A” e as sociedades “B” e “C” detêm 25 por cento cada uma da sociedade “A”.
A sociedade “A” teve um resultado líquido negativo. Como deverá ser contabilizado este resultado na sociedade “A”? E como deverá ser contabilizado este resultado nas sociedades detentoras do capital da sociedade “A”?
Parecer técnico
O pedido de parecer está relacionado com os registos contabilísticos do apuramento do resultado (prejuízo) por parte de uma entidade (empresa “A”) que é detida pela empresa “B” (50 por cento), pela empresa “C” (25 por cento) e pela empresa “D” (25 por cento).
Em concreto é questionado como contabilizar esta operação na perspetiva da empresa “A” e das empresas participantes (“B”, “C” e “D”).
Considerando que não é indicado o normativo contabilístico adotado pela entidade, iremos abordar esta temática no âmbito das normas contabilísticas e de relato financeiro (NCRF) previstas no aviso n.º 8 256/2015, de 29 de julho.
Na perspetiva da empresa “A” (empresa participada), tendo obtido um prejuízo no ano de 2022, e mesmo que tivesse obtido lucro, não existe propriamente nenhum registo contabilístico em especial, diferente de qualquer outra sociedade. Ou seja, a entidade procederá ao apuramento dos resultados, onde deverão ser saldadas todas as contas de gastos e rendimentos. A contrapartida para saldar as contas de gastos e rendimentos é a conta 811. Deverá efetuar-se a estimativa do imposto na conta 8121 (no caso em apreço eventualmente correspondente a tributação autónoma) e ainda 8122 (impostos diferidos caso se aplique). E, finalmente, saldar a conta 811, 8121 e 8122 por contrapartida da conta 818.
No início do ano seguinte, o saldo da conta 818 deve ser transferido para resultados transitados (conta 56).
Quanto aos registos contabilísticos na perspetiva das empresas “B”, “C” e “D”, somos do seguinte entendimento:
O tratamento contabilístico relacionado com as participações de partes de capital de outra entidade está previsto nas normas contabilísticas e de relato financeiro (NCRF) n.º 13 - Interesses em empreendimentos conjuntos e investimentos em associadas, NCRF 15 - Investimentos em subsidiárias e consolidação e NCRF 27 - Instrumentos financeiros.
É importante classificar o investimento financeiro, pois este pode ser considerado como investimento em subsidiária, em associada ou um mero ativo financeiro disponível para venda.
Se a participação social adquirida implicar que a entidade detentora da participação social passe a deter o controlo da entidade participada, isto é, se a entidade detentora tiver o poder de gerir as políticas financeiras e operacionais da entidade participada para obter benefícios da mesma, então tal participação deve ser considerada como um investimento numa subsidiária, aplicando-se os critérios de mensuração da NCRF 15 (MEP). Normalmente, o controlo é determinado pela detenção pela entidade investidora da maioria (mais de 50%) dos direitos de voto nas tomadas de decisão na entidade participada.
Se a participação social implicar que a entidade detentora da participação social apenas detém uma influência significativa (entre 20 a 50 por cento) da entidade participada, ou seja, se a entidade detentora apenas tem o poder de participar (e não de gerir) nas decisões das políticas financeira e operacional da investida, então tal participação deve ser considerada como um investimento numa associada, aplicando-se os critérios de mensuração da NCRF 13.
Uma empresa que apenas detém um investimento numa associada não é obrigada a preparar e apresentar demonstrações financeiras consolidadas. No entanto, se essa participação for relatada nas demonstrações financeiras consolidadas dessa empresa detentora, é mensurada também pelo método da equivalência patrimonial.
Finalmente, se a participação social da entidade detentora não permitir a existência de controlo ou de influência significativa nas políticas financeiras e operacionais da entidade participada, esse investimento deverá ser mensurado pelo custo ou pelo justo valor, se este for determinado fiavelmente, nos termos da NCRF 27.
Normalmente, não existe controlo ou influência significativa quando a participação social representar direitos de voto inferiores a 20 por cento nas tomadas de decisão na entidade participada.
De referir que para se determinar a existência de controlo ou influência significativa interessa determinar a percentagem de controlo (sobre os direitos de voto) na participada, e não a percentagem de participação. A percentagem de participação apenas é importante para a aplicação do método de equivalência patrimonial.
Um investimento numa subsidiária é contabilizado usando o método da equivalência patrimonial (MEP), exceto se existirem restrições severas e duradouras que prejudiquem substancialmente o exercício pela investidora dos seus direitos sobre o património ou a gestão dessa entidade ou a participação não seja materialmente relevante.
A percentagem de participação é importante para a aplicação do MEP, ou seja, para a mensuração do investimento na participada pelo MEP. No caso concreto, assumimos que a percentagem de detenção é superior a 20 por cento, pelo que estamos perante a participação em associadas ou em subsidiárias. Assim sendo, as participações devem ser reconhecidas pelo MEP.
De acordo com o parágrafo 63 da NCRF 13, pelo método da equivalência patrimonial, o investimento numa entidade é inicialmente reconhecido pelo custo e a quantia escriturada é aumentada ou diminuída para reconhecer a parte do investidor nos resultados da investida depois da data da aquisição.
A parte do investidor nos resultados da investida é reconhecida nos resultados do investidor.
No caso concreto, a questão colocada está relacionada com os registos contabilísticos referentes à imputação dos resultados imputável à participação.
Podem ser considerados os seguintes movimentos:
Em cada data de relato (data do balanço):
Pelo reconhecimento do ganho financeiro referente aos lucros da participada, se existirem (aplicação do MEP):
41x1 - Participações de capital - MEP
a
7851 - Rendimentos e ganhos em subsidiárias, associadas e empreendimentos conjuntos - Aplicação do MEP, pela proporção do lucro obtido pela participada.
Em cada data de relato (data do balanço):
Pelo reconhecimento da perda financeira referente aos prejuízos da participada, se existirem (aplicação do MEP):
6852 - Gastos e perdas em subsidiárias, associadas e empreendimentos conjuntos – Aplicação do método da equivalência patrimonial
a
41x1 - Participações de capital - MEP, pela proporção do prejuízo obtido pela participada.
Face ao exposto no caso apresentado, atendendo que a empresa “A” apurou um prejuízo de 23 797,68 euros, os registos contabilísticos em cada uma das participantes é:
Empresa “B” (50 por cento)
6852 - Gastos e perdas em subsidiárias, associadas e empreendimentos conjuntos – Aplicação do método da equivalência patrimonial
a
41x1 - Participações de capital - MEP, pela proporção do prejuízo obtido pela participada (11 898,84 euros).
Empresa “C” (25 por cento)
6852 - Gastos e perdas em subsidiárias, associadas e empreendimentos conjuntos – Aplicação do método da equivalência patrimonial
a
41x1 - Participações de capital - MEP, pela proporção do prejuízo obtido pela participada (5 949,42 euros).
Empresa “D” (25 euros)
6852 - Gastos e perdas em subsidiárias, associadas e empreendimentos conjuntos – Aplicação do método da equivalência patrimonial
a
41x1 - Participações de capital - MEP, pela proporção do prejuízo obtido pela participada (5 949,42 euros).
No caso de as entidades (“B”, “C” e “D”) estejam a adotar a norma contabilística e de relato financeiro para pequenas entidades (NCRF-PE), de acordo com o parágrafo 17.7 da NCRF-PE resulta que, a aplicação dos procedimentos referidos referente à classificação dos investimentos financeiros como investimentos em subsidiárias, associadas ou entidades conjuntamente controladas e a respetiva aplicação da mensuração subsequente pelo MEP não é obrigatória, sendo meramente opcional.
Pelo que se optar pela utilização do MEP, o registo contabilístico será idêntico ao efetuado pelas entidades que adotam as NCRF. Caso opte pelo reconhecimento utilizando o modelo do custo, o tratamento contabilístico será idêntico ao preconizado para as entidades que adotam a norma contabilística para as microentidades (NC-ME).
Caso as entidades (“B”, “C” e “D”) estejam a adotar a norma das microentidades (NC-ME), nos termos do parágrafo 17.3, uma entidade deve mensurar os seus ativos e passivos financeiros ao custo, entendido como a quantia nominal dos direitos e obrigações contratuais envolvidos.
Os ativos financeiros relativos a participações de capital são mensurados ao custo de aquisição, sujeito a ajustamentos subsequentes derivadas de eventuais imparidades.
A NC-ME nunca permite a mensuração de qualquer ativo financeiro ao justo valor, independentemente de existirem cotações oficiais em mercado regulamentado para esses instrumentos financeiros, nem pelo método de equivalência patrimonial. Adicionalmente, não se verifica a possibilidade de reconhecimento de qualquer goodwill decorrente da aquisição da participação, uma vez que, como referido, o método aplicável neste referencial contabilístico é o método do custo.
Em termos de contabilização, não se aplicando o método da equivalência patrimonial, pelo apuramento do lucro ou prejuízo nas participadas não há lugar a qualquer registo contabilístico na esfera das empresas participadas.