IRC - indemnização recebida no âmbito do furto de viatura
PT28232 - junho 2024
Em 2023 roubaram uma viatura a uma empresa, enquadrada no regime simplificado de IRC. Como o seguro cobria esta situação, recebeu da companhia de seguros uma indemnização no valor 22 450 euros.
A viatura tinha o valor contabilístico de 6 401,93 euros (valor de aquisição de 14 260 euros menos as amortizações acumuladas no valor de 7 858,07 euros).
Que valor deve ser considerado para efeitos de tributação em IRC? Em que campo do anexo E é preenchido este valor? Qual o coeficiente aplicado?
Parecer técnico
A questão colocada refere-se com o enquadramento fiscal relativo a uma indemnização recebida pela companhia de seguros no âmbito do furto de uma viatura. No caso questiona concretamente qual o coeficiente a aplicar pelo recebimento desta indemnização atendendo a que a empresa está enquadrada no regime simplificado de tributação em IRC.
O tratamento contabilístico destas situações (sinistro e roubos) está previsto nos parágrafos 64 e 65 da norma contabilística e de relato financeiro (NCRF) n.º 7 - Ativos fixos tangíveis.
O procedimento contabilístico previsto nessa norma estabelece que se devem contabilizar em separado os possíveis quatro acontecimentos, conforme se segue:
- Registar a perda por imparidade à data de balanço relativa aos danos resultantes do sinistro ou roubo do item do ativo fixo tangível, para reduzir a quantia escriturada desse item para o seu valor recuperável, nos termos da NCRF 12, (para um valor inferior correspondente ao valor de uso ou ao justo valor do bem, do dois o maior);
- Registar o desreconhecimento do item (ou partes) do ativo fixo tangível se ocorreu a perda total (ou parcial) desse item no sinistro ou roubo, nos termos dos parágrafos 66 a 71 da NCRF 7;
- Registar o direito de receber a compensação (indemnização) da companhia de seguros, apenas quando esta se tornar recebível, nos termos do parágrafo 64 da NCRF 7, registando-se posteriormente o recebimento da compensação (indemnização) quando esta for paga pela seguradora; e
- Registar a aquisição dos novos equipamentos ou das reparações dos itens do ativo fixo tangível que continuarão em uso na atividade da empresa, pelo respetivo custo de aquisição ou de substituição, de acordo com as regras previstas no parágrafo 16 e seguintes da NCRF 7.
Estes quatro acontecimentos podem ser registados em momentos diferentes, dependendo do cumprimento dos critérios previstos na NCRF 7.
Relativamente à viatura roubada e consequente comunicação às autoridades, pressupomos que está dada como perdida. Deste modo, não há que proceder ao reconhecimento de perdas por imparidade, havendo que efetuar o desreconhecimento desses itens do balanço à data do sinistro e da participação do roubo às autoridades.
Nos termos do parágrafo 66 da NCRF 7 (por remissão do parágrafo 65b)), deve proceder-se ao desreconhecimento da quantia escriturada de um item do ativo fixo tangível quando não se espere futuros benefícios económicos do seu uso ou alienação. No caso em concreto, tendo a viatura sido roubada, a entidade deixa de esperar a obtenção de benefícios económicos pela sua utilização ou venda posterior.
No momento da participação do roubo às autoridades, pelo desreconhecimento dos itens do ativo fixo tangível:
Pela anulação das depreciações acumuladas e perdas por imparidade acumuladas:
- Débito da conta 438/9 - Depreciações acumuladas/Perdas por imparidade acumuladas por contrapartida a crédito da conta 43x - Ativos fixos tangíveis, pelo montante das depreciações acumuladas e perdas por imparidade acumuladas.
Pelo desreconhecimento da quantia escriturada do item do ativo fixo tangível:
- Débito da conta 6872 - Gastos e perdas em investimentos não financeiros - Sinistros dependendo se existe uma mais ou menos-valia por contrapartida a crédito da conta 43x - Ativos fixos tangíveis, pela quantia escriturada do item do ativo fixo tangível abatido.
No momento em que a companhia de seguros informa que irá pagar a compensação (indemnização):
- Débito da conta 278x - Outros devedores e credores - Seguradora X por contrapartida a crédito da conta 7872 - Rendimentos e ganhos em investimentos não financeiros - Sinistros, pela quantia a receber da companhia de seguros pela compensação (valor da indemnização e juros relativo) dos itens do ativo fixo tangível furtado.
No momento do recebimento da compensação (indemnização) da companhia de seguros:
- Débito da conta 12 - Depósitos à ordem por contrapartida a crédito da conta 278x - Outros devedores e credores - Seguradora X, pelo montante recebido.
Os sujeitos passivos de IRC, não isentos nem sujeitos a um regime especial de tributação, que exerçam a título principal uma atividade de natureza comercial, industrial ou agrícola podem optar pelo referido regime simplificado, desde que verifiquem, cumulativamente, as seguintes condições:
- Tenham obtido, no período de tributação imediatamente anterior, um montante anual ilíquido de rendimentos não superior a 200 mil euros;
- O total do seu balanço relativo ao período de tributação imediatamente anterior não exceda 500 mil euros;
- Não estejam legalmente obrigados à revisão legal de contas;
- O respetivo capital social não seja detido em mais de 20 por cento, direta ou indiretamente, nos termos do n.º 6 do artigo 69.º do CIRC, por entidades que não preencham alguma das condições previstas nas alíneas anteriores, exceto quando sejam sociedades de capital de risco ou investidores de capital de risco;
- Adotem o regime de normalização contabilística para microentidades aprovado pelo Decreto-Lei n.º 36-A/2011, de 9 de março;
- Não tenham renunciado à aplicação do regime nos três anos anteriores, com referência à data em que se inicia a aplicação do regime.
O artigo 86.º-B do Código do IRC estabelece os coeficientes para a determinação da matéria coletável para efeitos do regime simplificado de IRC, que são:
«a) 0,04 das vendas de mercadorias e produtos, bem como das prestações de serviços efetuadas no âmbito de atividades de restauração e bebidas e de atividades hoteleiras e similares, com exceção daquelas que se desenvolvam no âmbito da atividade de exploração de estabelecimentos de alojamento local na modalidade de moradia ou apartamento;
b) 0,75 dos rendimentos das atividades profissionais especificamente previstas na tabela a que se refere o artigo 151.º do Código do IRS;
c) 0,10 dos restantes rendimentos de prestações de serviços e subsídios destinados à exploração;
d) 0,30 dos subsídios não destinados à exploração;
e) 0,95 dos rendimentos provenientes da mineração de criptoativos, de contratos que tenham por objeto a cessão ou utilização temporária da propriedade intelectual ou industrial ou a prestação de informações respeitantes a uma experiência adquirida no setor industrial, comercial ou científico, dos outros rendimentos de capitais, do resultado positivo de rendimentos prediais, do saldo positivo das mais e menos-valias e dos restantes incrementos patrimoniais;
f) 1,00 do valor de aquisição dos incrementos patrimoniais obtidos a título gratuito determinado nos termos do n.º 2 do artigo 21.º;
g) 0,50 dos rendimentos da exploração de estabelecimentos de alojamento local na modalidade de moradia ou apartamento, localizados em área de contenção;
h) 0,35 dos rendimentos da exploração de estabelecimentos de alojamento local na modalidade de moradia ou apartamento não previstos na alínea anterior.
i) 0,15 dos rendimentos relativos a criptoativos, excluindo os decorrentes da mineração, que não sejam considerados rendimentos de capitais, nem resultem do saldo positivo das mais e menos-valias e dos restantes incrementos patrimoniais.»
Os coeficientes são aplicados a rendimentos específicos, tendo em conta a sua natureza e classificação nos termos dos códigos fiscais.
Desta forma, atendendo ao acima disposto, no caso de uma indemnização recebida de uma entidade seguradora, relacionada com um sinistro automóvel, esta deverá ser contabilizada na classe 7 - Rendimentos, pelo que entendemos que, tratando-se de um rendimento, deverá igualmente concorrer para a determinação da matéria coletável, ainda que com a aplicação do coeficiente de 0,10, previsto na alínea c) do n.º 1 do artigo 86.º-B do CIRC, que será o coeficiente residual a aplicar nestes casos.
Consequentemente, no anexo E da declaração modelo 22, estes rendimentos deverão ser incluídos no campo 4 do quadro 03.
Contudo, caso estejamos perante um bem do ativo fixo tangível da entidade, como será o caso em concreto, e o valor recebido da entidade seguradora deva constituir valor de realização para efeitos da mais-valia a apurar com o desconhecimento do AFT, será de aplicar o coeficiente de 0,95 previsto na alínea e) do n.º 1 do artigo 86.º-B do CIRC, que será o coeficiente aplicável às mais-valias.
Consequentemente, no anexo E da declaração modelo 22, estes rendimentos deverão ser incluídos no campo 11 do quadro 03.